Uso de Antibióticos Guiado pela Procalcitonina em Infecção do Trato Respiratório Inferior
04 de julho de 2024
6 minutos de leitura
Uma estratégia de uso de antimicrobianos baseada nos níveis de procalcitonina reduz o uso de antibióticos em pacientes com infecção respiratória baixa?
O uso inadequado de antimicrobianos é um problema de saúde pública, sendo associado a elevados custos e aumento da resistência bacteriana. Este é um problema particularmente relevante em pacientes com infecções respiratórias baixas, onde não há uma forma simples de diferenciar quadros bacterianos e virais. A procalcitonina é um peptídeo que tende a se elevar de forma mais pronunciada em infecções bacterianas e que poderia ser utilizada para reduzir o uso de antibióticos em pacientes com quadros virais ou inflamatórios. Contudo, o impacto da terapia antimicrobiana guiada pela procalcitonina em desfechos clínicos ainda é motivo de debate, com recomendações variando entre diferentes diretrizes. Portanto, o objetivo do estudo ProACT foi avaliar se a orientação baseada nos níveis de procalcitonina pode reduzir a exposição aos antibióticos em pacientes com suspeita de infecção do trato respiratório inferior.
Ensaio clínico multicêntrico (14 hospitais nos EUA).
Randomizado.
Não cego.
Foi calculado que 1514 pacientes seriam necessários para ter 80% de poder para demonstrar uma diferença absoluta de 1 dias de antibiótico entre os grupos e para declarar uma margem de não inferioridade de 4,5% na incidência de eventos adversos, com erro alfa de 5%, assumindo uma taxa de 10% de perdas de seguimento. Posteriormente, devido a uma perda de seguimento de 18% foi optado por ampliar a amostra para 1664 pacientes.
Pacientes com suspeita de infecção do trato respiratório inferior.
Adultos (> 18 anos).
Suspeita de infecção do trato respiratório inferior há menos de 28 dias.
Incerteza da equipe médica quanto à necessidade de antibióticos.
Uso recente ou atual de antibióticos.
Uso de vasopressores ou ventilação mecânica.
Imunossupressão.
Infecções documentadas em outros sítios.
Diálise crônica, câncer metastático ou cirurgia recente (condições que podem elevar a procalcitonina).
Pacientes privados de liberdade ou sem suporte social.
Terapia guiada pela procalcitonina. A equipe assistente era comunicada sobre o resultado e recomendações eram fornecidas baseada nos níveis de procalcitonina (podendo o uso de antibióticos ser desencorajado ou sugerido).
Cuidado usual. Era realizada a coleta da procalcitonina, porém os resultados não eram compartilhados com a equipe assistente.
Em ambos os grupos os médicos responsáveis pelo tratamento tinham autonomia quanto às decisões terapêuticas.
Eram obtidas amostras de sangue para a dosagem de procalcitonina na admissão, entre 6-24h após e depois em 3, 5 e 7 dias (caso o paciente continuasse hospitalizado).
Desfecho primário: exposição à antibióticos, medida pelo número de dias de uso de antibiótico em 30 dias após a randomização.
Desfechos secundários: uso de antibióticos no departamento de emergência, manutenção de antibióticos no dia 30, admissão em UTI, necessidade de readmissão em pronto-socorro em 30 dias e qualidade de vida avaliado pelo Airway Questionnaire 20.
Desfecho de segurança: eventos adversos em 30 dias.
Entre novembro de 2014 e maio de 2017 foram incluídos 1664 pacientes, sendo que 1345 (81,2%) completaram o seguimento de 30 dias. As características dos pacientes na admissão foram similares:
Procalcitonina x Cuidado usual
Idade: 52,9 x 53,2 anos
Sexo masculino: 43,2% x 42,7%
Charlson: 1,4 x 1,4
DPOC prévio: 32,5% x 31,8%
Duração dos sintomas: 5,5 x 5,5 dias
Nível de procalcitonina: 0,05 x 0,05 mcg/L
< 0,1 mcg/L: 72,8% x 82,2%
0,1 a 0,25 mcg/L: 19,6% x 9,1%
0,25 a 0,50 mcg/L: 3,3% x 2,9%
> 0,50 mcg/L: 4,3% x 5,7%
Diagnóstico final:
Asma: 37,7% x 40,8%
DPOC: 32,2% x 31,5%
Bronquite aguda: 25,3% x 23,1%
Pneumonia comunitária: 20,3% x 19,6%
Necessidade de internação: 45,8% x 48,7%
A aderência da equipe assistente às recomendações no grupo procalcitonina foi de 72,9% na avaliação inicial na emergência e 64,8% no geral (contando todas as medidas realizadas).
Não houve diferença entre os grupos no número de dias em uso de antibióticos (4,2 dias no grupo procalcitonina e 4,3 dias no grupo controle; P = 0,87). Os resultados foram consistentes ao longo de várias análises de sensibilidade.
Eventos adversos ocorreram em 11,7% do grupo procalcitonina e 13,1% do grupo controle (P < 0,001 para não inferioridade; IC 95% entre -4,6% e 1,7%).
O percentual de pacientes que utilizou antibióticos foi similar entre os grupos (57% x 61,8%).
Os demais desfechos secundários foram similares entre os grupos.
A dosagem da procalcitonina acompanhada de recomendações sobre o uso de antimicrobianos não teve impacto no número de dias em uso de antibióticos em pacientes com suspeita de infecção respiratória baixa.
Estudo multicêntrico e randomizado, aumentando a validade externa e a robustez dos resultados.
Abordagem pragmática, utilizando o teste de procalcitonina de forma similar à prática clínica real, refletindo melhor a aplicabilidade dos achados no dia a dia.
O estudo utilizou um monitoramento rigoroso dos níveis de procalcitonina e incluiu várias medições ao longo do período de estudo (na admissão, entre 6-24 horas após, e nos dias 3, 5 e 7). Isso garantiu um acompanhamento detalhado das mudanças nos níveis de procalcitonina e permitiu ajustes baseados em dados atualizados.
A maioria dos pacientes apresentava doença leve e comorbidades que poderiam explicar os sintomas, resultando em menor uso de antimicrobianos no grupo controle e reduzindo as oportunidades de mudança de conduta baseada na procalcitonina.
Houve uma taxa considerável de perdas de seguimento (quase 20%), o que pode influenciar os resultados do estudo se essas perdas não forem aleatórias.
A aderência relativamente baixa às recomendações baseadas na procalcitonina pode ter afetado a capacidade do estudo de demonstrar diferenças significativas. Muitos médicos continuaram a prescrever antibióticos mesmo quando os níveis de procalcitonina eram baixos, refletindo resistência à mudança nas práticas estabelecidas.
Autor do conteúdo
Luis Júnior
Referências
Públicação Oficial
https://app.doctodoc.com.br/conteudos/uso-de-antibioticos-guiado-pela-procalcitonina-em-infeccao-do-trato-respiratorio-inferior
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