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    Uso de Aminoácidos Intravenosos para Proteção Renal

    21 de novembro de 2024

    8 minutos de leitura

    Pergunta:

    • A infusão de aminoácidos intravenosos é capaz de reduzir a ocorrência de injúria renal aguda em pacientes submetidos a cirurgia cardíaca eletiva com circulação extracorpórea?

    Background:

    • A injúria renal aguda (IRA) é uma das principais complicações relacionadas à cirurgia cardíaca com uma incidência entre 5-43%, sendo relacionada a curto prazo com aumento de morbimortalidade e a longo prazo com maio risco de desenvolvimento de doença renal crônica (DRC). Sua fisiopatologia é complexa, sendo a hipoperfusão renal um fator chave para redução da taxa de filtração glomerular (TFG), especialmente em procedimentos que envolvem circulação extracorpórea (CEC). Para atenuar esse efeito estudos prévios utilizaram a infusão de aminoácidos com o intuito de recrutar a reserva funcional renal apresentando resultados positivos. Neste contexto, o estudo PROTECTION avaliou se a infusão de aminoácidos em paciente submetidos eletivamente a cirurgia cardíaca, com uso de circulação extracorpórea, poderia reduzir a ocorrência de IRA.

    Desenho do Estudo:

    • Ensaio clínico randomizado

    • Placebo-controlado, duplo cego;

    • Multicêntrico com 22 centros em três países (Itália, Singapura e Croacia). 

    • Os autores levantaram a hipótese que a IRA ocorreria em 25% dos pacientes no grupo placebo com base em estudos anteriores, o tamanho da amostra foi calculado para fornecer 90% de poder estatístico, permitindo a detecção de uma redução de 20% no risco de lesão renal aguda no grupo de tratamento, com um nível de significância bicaudal de 0,05. 

    • A randomização do estudo foi realizada por meio de sistema Web-based garantindo sigilo da atribuição dos grupos do estudo. 

    • Para garantir a validade dos resultados, o estudo incorporou análises interinas utilizando o método de O’Brien-Fleming, ajustando os limites de significância para manter o controle do erro tipo I ao longo do estudo.

    • A coleta de creatinina foi realizada nos primeiros 7 dias de internação hospitalar e foi realizado seguimento com contato telefônico por um investigador treinado sem conhecimento das atribuições dos grupos com 30, 90 e 180 dias após a randomização.

    População:

    • Pacientes em programação para cirurgia cardíaca incluídos de 2019 a 2024 

    Critérios de Inclusão:

    • Adultos >18 anos ou mais

    • Cirurgia cardíaca eletiva que necessidade de circulação extracorpórea

    • Expectativa de permanência na UTI por pelo menos uma noite após a cirurgia.

    Critérios de Exclusão:

    • Pacientes que estejam realizando terapia renal substitutiva previamente a abordagem cirúrgica;

    • Pacientes em programação de realizar terapia renal substitutiva no pós-operatório (seja diálise intermitente ou contínua)

    • Portadores de doença renal crônica IV e V baseados na taxa de filtração glomerular estimada (TFGe), ou seja, TFGe <30mL/min/1,73m2.

    • Paciente transplantado renal

    • Doença hepática grave (Child-Pugh >7 pontos)

    • Hipersensibilidade a um ou mais dos aminoácidos incluídos no estudo

    • Alteração congênita do metabolismo de aminoácidos

    • Pacientes grávidas ou amamentando

    Intervenção:

    • Infusão contínua de uma mistura balanceada de aminoácidos (Isopuramin 10%, Baxter) na dose de 2g de aminoácidos por kg de peso corporal ideal por dia, até um máximo de infusão de 100 g por dia.

      • A infusão foi iniciada na admissão na sala de cirurgia e continuou por até 72 horas, ou até a alta da UTI, início da terapia renal substitutiva ou morte, o que ocorresse primeiro.

      • Se a nutrição enteral ou parenteral fosse iniciada dentro das primeiras 72 horas, a dose da infusão de aminoácidos era ajustada para garantir uma ingestão total de 2g/kg/dia.

    Controle:

    • Infusão contínua de solução de Ringer (Ringer, Baxter);

      • A administração foi realizada seguindo o mesmo protocolo do grupo de aminoácidos.

      • A solução de Ringer foi entregue em frascos indistinguíveis dos usados no grupo de intervenção, garantindo o cegamento do estudo.

    Desfechos:

    • Primário: ocorrência de injúria renal aguda (IRA) nos primeiros 7 dias após a cirurgia. 

      • A IRA foi definida de acordo com os critérios de creatinina da Kidney Disease: Improving Global Outcomes (KDIGO) para estágio 1 ou superior. Isso inclui um aumento no nível de creatinina de pelo menos 0,3 mg/dL em 48 h ou um aumento de 50% da creatinina em relação ao nível basal dentro de uma semana.

    • Secundários: gravidade da LRA: Graduação dos estágios de IRA, conforme os critérios de KDIGO; necessidade e o tempo de terapia renal substitutiva durante a internação hospitalar; tempo que os pacientes permaneceram em ventilação mecânica após a cirurgia; tempo de permanência dos pacientes na unidade de terapia intensiva e no hospital; taxas de mortalidade registradas no momento da alta da UTI, alta hospitalar, e aos 30, 90 e 180 dias após a randomização.

    Características dos Pacientes:

    • 3.511 pacientes // Masculino 70% e Feminino 30%

    • Grupo aminoácidos (N=1.759) x Grupo controle (N=1.752)

      • Idade: 66 x 67

      • Índice de massa corpórea: 26 x 26

      • Creatinina no pré-operatório: 0,96 mg/dL x 0,94 mg/dL

      • Hemoglobina no pré-operatório: 13,9 g/dL x 13,8 g/dL

      • Fração de ejeção: 59% x 60%

      • NYHA

        • Classe 1: 22% x 23%

        • Classe 2: 56% x 56%

        • Classe 3: 18% x 19%

        • Classe 4: 1,8% x 1,3%

      • Hipertensão arterial: 62% x 61,8%

      • Antecedente de infarto do miocárdio: 15% x 14%

      • Cateterismo cardíaco nas últimas 48 horas: 17% x 18%

      • Diabetes Mellitus: 17% x 19%

      • Cirurgia cardíaca previa: 9,4% x 7,9%

      • Uso regular de IECA ou BRA: 51% x 51%

      • Uso regular de diurético: 35% x 35%

      • Mediana de circulação extra-corporea (IQR): 93 min (73-121) x 94 min (73-122)

      • Tipo de cirurgia:

        • Revascularização do miocárdio: 34% x 36%

        • Troca de válvula mitral: 38% x 36%

        • Troca de válvula aórtica: 37% x 37%

      • Uso de diurético de alça no intraoperatório: 40% x 39%

      • Uso intraoperatório de droga vasoativa ou inotrópico:

        • Adrenalina: 33% x 34%

        • Noradrenalina: 30% x 28%

        • Dobutamina: 9,4% x 8,1%

    Resultados:

    • O desfecho primário, ocorrência de IRA, foi observado em frequência significativamente menor no grupo de aminoácidos: 474 pacientes no grupo de aminoácidos (26,9%) e em 555 pacientes no grupo placebo (31,7%) (RR, 0,85; IC95% 0,77 a 0,94; p=0,002). 

    • A maioria dos pacientes que evoluíram com IRA apresentavam no estágio KDIGO 1 - 90% no grupo de aminoácidos e 89% no grupo de controle

    • A ocorrência de IRA KDIGO 3, embora infrequente nos grupos (<3% em ambos os grupos), foi observada significativamente em menor frequência no grupo aminoácidos: 52 pacientes (3%) no grupo controle, mas apenas em 29 pacientes (1,6%) no grupo de aminoácidos (RR, 0,56; IC 95% 0,35 -0,87)

    • A necessidade de terapia renal substitutiva foi maior no grupo controle, mas sem significância estatística. 33 pacientes do grupo controle (1,9%) e 24 pacientes no grupo aminoácido (1,4%) (RR, 0,73; IC95% 0,43 a 1,22)

    • Não houve diferenças estatisticamente significativas em relação aos desfechos secundários (tempo em ventilação mecânica, tempo de internação na UTI, tempo de internação hospitalar e mortalidade).

    Conclusões:

    • Em pacientes adultos programados para cirurgia cardíaca eletiva com circulação extracorpórea, a infusão de aminoácidos diminuiu significativamente a ocorrência de injúria renal aguda.

    Pontos Fortes:

    • Tema relevante visto que IRA é uma das principais complicações no pós-operatório de cirurgia cardíaca;

    • A busca por uma intervenção que possa reduzir sua ocorrência e atenuar sua gravidade da IRA nesses casos é necessária para complementar o manejo atual se baseia no suporte utilizando as recomendações do bundle do KDIGO;

    • O estudo utilizou a classificação de KDIGO para definição de IRA portanto, utilizou o método que é o recomendado atualmente garantido a comparabilidade dos resultados com outros estudos;

    • Este foi um ensaio clínico randomizado, duplo-cego e controlado por placebo, multicêntrico e multinacional. Essas características fortalecem a credibilidade e aumentam a validade externa.

    • Teve um cegamento muito eficaz utilizando frascos indistinguíveis para o uso de aminoácido e ringer reduzindo viés de observação;

    Pontos Fracos:

    • O estudo foi limitado a uma população europeia, com predomínio de indivíduos brancos o que pode comprometer a generalização dos resultados para outras populações

    • Não foi especificado o manejo dos pacientes que evoluíram com IRA. Atualmente nos baseamos no bundle do KDIGO para manejo desde pacientes, e a sua não realização pode comprometer o prognóstico do paciente impactando nos desfechos;

    • Pacientes de maior risco para desenvolver quadros mais graves de IRA não foram analisados, o estudo excluiu portadores de DRC IV e V. 

    • Outros marcadores para avaliação de função renal ou de lesão estrutural não foram analisados e poderiam fornecer mais informações em relação ao benefício da intervenção com aminoácidos


    Autor do conteúdo

    Jeison Gois


    Referências

    Públicação Oficial

    https://app.doctodoc.com.br/conteudos/uso-de-aminoacidos-intravenosos-para-protecao-renal


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