Triagem Eletrônica de Sepse em Pacientes Admitidos em Unidades de Internação
06 de fevereiro de 2025
5 minutos de leitura
O uso de um sistema eletrônico de triagem de sepse é capaz de reduzir a mortalidade em pacientes admitidos em enfermarias?
O reconhecimento precoce da sepse é essencial para melhorar o prognóstico dos pacientes com essa condição. No entanto, a evidência que sustenta programas de rastreamento de sepse em unidades de internação é limitada, consistindo principalmente em estudos observacionais e pequenos ensaios randomizados, cujos resultados são conflitantes. Além disso, há preocupações quanto ao aumento do consumo de antimicrobianos e ao surgimento de patógenos oportunistas associados à implementação desses programas. Com base nessa lacuna na literatura, foi realizado o estudo SCREEN que foi randomizado por clusters para avaliar o impacto de um sistema eletrônico de triagem de sepse, baseado no quick-SOFA, na mortalidade de pacientes internados em enfermarias.
Ensaio clínico multicêntrico (45 enfermarias em cinco hospitais na Arábia Saudita).
Randomizado por clusters com progressão em escalada (stepped-wedge).
Após um período inicial de dois meses, as 45 unidades (clusters) foram randomizadas em grupos de 5 a cada dois meses para iniciar o rastreamento com o sistema eletrônico. Isso resultou em um total de 9 sequências, de modo que, ao final do estudo, todas as unidades estavam utilizando o sistema eletrônico de triagem.
Estudo não cego.
Foi calculado que 65.250 pacientes, uma média de 145 pacientes por enfermaria em cada período, seriam necessários para demonstrar uma redução absoluta de mortalidade de 3,13% para 2,46% com 80% de poder e erro alfa de 5% e um índice de correlação intra-cluster de 0,22.
Pacientes admitidos em unidades de internação clínica, cirúrgica ou oncológica entre 2019 e 2021.
Adultos (> 18 anos).
Admitidos nas enfermarias clínicas, cirúrgicas e oncológicas dos centros do estudo.
Enfermarias pediátricas e neonatais.
Enfermarias obstétricas.
Enfermarias cardíacas.
Pacientes com limitação de suporte à vida também eram excluídos.
Triagem eletrônica de sepse: caso a pontuação no quick-SOFA fosse maior ou igual a 2 (FR ≥ 22 irpm, PAS ≤ 100 mmHg e Glasgow ≤ 14) a equipe era notificada.
Um alerta no prontuário eletrônico por meio de uma janela adicional (pop-up) era emitido para médicos e enfermeiros.
Um alarme sonoro e visual era emitido em um dispositivo portátil utilizado pelo profissional de enfermagem responsável pelo setor.
Cuidado usual.
No grupo controle o alerta baseado no quick-SOFA era calculado, porém ficava em modo silencioso.
No grupo intervenção, além de deixar o alerta disponível, havia treinamento dos médicos e da equipe de enfermagem, bem como auditorias com feedback para cada unidade sobre o seu desempenho em relação aos alertas.
Desfecho primário: mortalidade hospitalar em até 90 dias.
Desfechos secundário: admissão em UTI, ativação do time de resposta rápida, ativação de código azul, suporte orgânico (ventilação mecânica, vasopressores, diálise), novos agentes multirresistentes e infecção por Clostridium difficile.
60.055 pacientes | Feminino = 49% e Masculino = 51%
43 enfermarias (2 enfermarias foram excluídas pois se tornaram UTIs durante a pandemia de covid-19)
Triagem eletrônica (N=29.442) x Cuidado usual (N=30.613)
Idade mediana, em anos: 59 x 59
Sexo feminino: 49,4% x48,7%
Tipo de enfermaria:
Clínica: 39,7% x 34%
Cirúrgica: 28,2% x 39,7%
Mista: 22,7% x 15,1%
Oncológica: 9,5% x 11,1%
Admitido do departamento de emergência: 69,4% x 66,6%
Escore Charlson: 2 x 2
Sem infecção documentada: 74,8% x 77,5%
Covid-19: 11,8% x 5,2%
O uso de triagem eletrônica foi associado a uma redução da mortalidade hospitalar ajustada em 90 dias.
A mortalidade hospitalar não ajustada em 90 dias não foi diferente entre os grupos: 3,2% no grupo triagem e 3,1% no grupo cuidado usual.
Após ajustes para variáveis de confusão (período, cluster entre as unidades, hospitais, estado da COVID-19), o grupo triagem apresentou uma redução da mortalidade em 90 dias (RR ajustado 0,85; IC 95% 0,77 a 0,93; P <0,001).
No grupo triagem ocorreram 9447 alertas em 4299 pacientes (14,6%), com uma mediana de 3 alertas por paciente. No grupo de cuidado usual ocorreram 8418 alertas em 5394 pacientes (17,6%), com uma mediana de 2 alertas por paciente.
No grupo triagem, 73,4% dos alertas foram identificados pelos enfermeiros e 73,8% pelos médicos, os quais identificaram que 34,8% tinham sepse. No grupo de cuidado usual 12,2% dos alertas foram identificados por enfermeiros e 12,7% pelos médicos.
O grupo triagem teve maior chance de ativação de código azul (OR ajustado 1,24; IC95% 1,02 a 1,50), além de menor uso de vasopressores (OR ajustado 0,86, IC 95% 0,78 a 0,94), maior necessidade de terapia de substituição renal (OR ajustado 1,20; IC95% 1,11 a 1,31), menor incidência de agentes multirresistentes (OR ajustado 0,88, IC 95% 0,78 a 0,99) e maior incidência de Clostridium (OR ajustado 1,30, IC95% 1,03 a 1,65).
Houve redução estatisticamente significativa no tempo de internação hospitalar, no número de dias livres de UTI e no número de dias livre de antimicrobianos, porém com relevância clínica mínima (diferenças absolutas menores que 0,1 dias).
O uso de um sistema eletrônico de triagem de sepse é capaz de reduzir a mortalidade hospitalar em 90 dias em pacientes admitidos em enfermarias.
Estudo randomizado e multicêntrico.
Estudo pragmático.
Amostra grande com elevado poder estatístico.
Apesar de o objetivo ter sido identificar pacientes com sepse, a ferramenta de triagem empregada (quick-SOFA) foi desenvolvida originalmente como uma escala preditora de risco de morte e não como uma ferramenta para triagem de sepse.
A interpretação dos resultados é complexa, visto que as análises não ajustadas e as ajustadas tiveram resultados distintos.
Diversos desfechos secundários apresentaram direções diferentes nos resultados, podendo representar achados espúrios com significância estatística encontrada devido ao grande tamanho da amostra.
Autor do conteúdo
Luis Júnior
Referências
Públicação Oficial
https://app.doctodoc.com.br/conteudos/triagem-eletronica-de-sepse-em-pacientes-admitidos-em-unidades-de-internacao
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