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    Tocilizumabe na Arterite de Células Gigantes

    30 de julho de 2024

    9 minutos de leitura

    Pergunta:

    • O uso de tocilizumabe diminui as recaídas em pacientes com arterite de células gigantes em desmame de glicocorticoides?

    Background:

    • Os glicocorticoides (GC) são o pilar do tratamento da arterite de células gigantes (ACG), já que conseguem controlar a doença e evitar a perda visual, complicação mais temida. No entanto, as recaídas são frequentes na retirada dos glicocorticoides, levando à necessidade de cursos prolongados e aumentando significativamente o risco de efeitos adversos. O tocilizumabe (TCZ) é um antagonista do receptor de interleucina 6 (IL-6), que mostrou potencial em estudos de fase 2 e séries de casos na redução dos corticoides e na manutenção de remissão nesta doença. Diante disso, foi realizado o estudo GiACTA, com o objetivo de testar se o tocilizumabe aumentaria a taxa de remissão sustentada livre de corticoides, quando comparado com a estratégia de descontinuação dos corticoides sem o uso de tocilizumabe. 

    Desenho do estudo:

    • Ensaio clínico randomizado, paralelo, de superioridade

    • Multicêntrico (aproximadamente 100 centros dos EEUU e Europa)

    • Duplo cego, double-dummy

    • Randomização em 4 grupos na proporção 2:1:1:1

      • TCZ semanal e desmame de GC em 26 semanas

      • TCZ a cada 2 semanas e desmame de GC em 26 semanas

      • Placebo (PBO) semanal e desmame de GC em 26 semanas

      • Placebo semanal e desmame de GC em 52 semanas 

    • Estratificação por dose de corticoide na consulta inicial do estudo

    (prednisona > 30 mg vs prednisona ≤  30 mg)

    • Assumindo uma diferença no tamanho de efeito de 40% no desfecho primário, foi estimado que uma amostra de 100 pacientes no grupo TCZ semanal e uma amostra de 50 pacientes nos grupos TCZ, a cada 2 semanas, e PBO com desmame em 26 semanas, respectivamente, proporcionariam um poder de 90% para detectar uma diferença na porcentagem de pacientes com remissão sustentada na semana 52, em cada grupo TCZ vs PBO.

    População:

    • Pacientes com arterite de células gigantes recém diagnosticados, ou previamente diagnosticados refratários ou com recaída, recrutados entre 2013 e 2015 

    Critérios de inclusão:

    • Idade ≥  50 anos

    • Doença ativa dentro de 6 semanas da consulta de entrada no estudo

    • História de Velocidade de Hemossedimentação (VHS) ≥ 50 mm/hora

    • Diagnóstico baseado em biópsia de artéria temporal com achados de ACG ou evidência de vasculite de grandes vasos em imagem (Angiografia, AngioTC, AngioRM ou PET-TC)

    • Doença ativa definida, como manifestações inequívocas de sintomas cranianos da ACG ou sintomas de polimialgia reumática e aumento nas concentrações de reagentes de fase aguda (VHS ≥ 30 mm/hora ou Proteína C Reativa [PCR] ≥ 1 mg/dL)

    Critérios de exclusão:

    • Cirurgia de grande porte recente ou próxima

    • Paciente transplantado

    • Evento isquêmico maior, por ACG ou não, dentro de 12 semanas do screening

    • Tratamento prévio recente com agentes em investigação, depletores de células, alquilantes, imunossupressores, imunomoduladores ou corticoides

    • História de reação alérgica grave a anticorpos monoclonais ou prednisona

    • Evidência de doença grave concomitante em outros órgãos ou sistemas. 

    • Presença de qualquer contra-indicação a imunobiológicos como infecções virais, bacterianas, fúngicas, hepatopatia, disfunção renal, imunodeficiência, malignidade, anormalidades hematológicas. 

    • Risco de perfuração intestinal (diverticulite, diverticulose requerendo antibiótico, Crohn, colite ulcerativa e outras)

    • Mulheres e Homens com potencial reprodutivo

    • História de álcool, drogas, ou abuso químico dentro de 1 ano da consulta inicial

    • Peso corporal > 150 kg

    Intervenção:

    • Tocilizumabe 162 mg subcutâneo semanalmente ou a cada 2 semanas, em combinação com desmame de glicocorticoides em 26 semanas

    Controle:

    • Placebo semanal com desmame de glicocorticoides em 26 semanas

    • Placebo semanal e desmame de glicocorticoides em 52 semanas 

    Outros tratamentos e definições:

    • O grupo com desmame de GC em 52 semanas foi usado para avaliar desfechos secundários, como a comparação do tempo de desmame mais longo.

    • Os pesquisadores do estudo não tinham acesso aos exames laboratoriais dos pacientes, que foram monitorizados por um avaliador independente. 

    Desfechos:

    • Primário: diferença na porcentagem de pacientes em remissão sustentada livre de prednisona na semana 52, entre cada grupo que recebeu TCZ e o grupo placebo que realizou desmame de corticoides em 26 semanas

    • Remissão: ausência de recaída e PCR < 1 mg/dL.

    • Remissão sustentada: remissão contínua da semana 12 até a 52, com adesão ao desmame de glicocorticoides.

    • Recaída (flare): recorrência de sintomas ou sinais de arterite de células gigantes, ou VHS ≥ 30 mm/hora, necessitando aumento da dose de corticoides.

    • Secundários: diferença na porcentagem de pacientes em remissão sustentada livre de prednisona na semana 52 em cada grupo, diferença na dose cumulativa de corticoides durante o período de estudo de 52 semanas em cada grupo, primeira recaída depois da remissão numa análise de “tempo para o evento” em cada grupo, mudanças na qualidade de vida desde o início do estudo até a semana 52 (Formulário SF-36) em cada grupo, avaliação de atividade pelo paciente (Escala visual analógica 0-100) em cada grupo. 

    Características dos pacientes:

     

    Masculino (25% Masculino)Feminino (75% Feminino)
    Masculino
    Feminino

     

    • TCZ semanal e desmame 26 semanas (N=100)  x TCZ cada 2 semanas e desmame 26 semanas (N=50) x Placebo semanal e desmame em 26 semanas (N = 50) x Placebo semanal e desmame em 52 semanas (N = 51)

    • Idade (anos): 69,5±8,5 x 69,4±8,2 x 69,3±8,1 x 67,8±7,7 

    • As características basais dos participantes foram semelhantes nos grupos. 

      • Raça branca 97% x 94% x 100% x 96%

      • Novo diagnóstico 47% x 52% x 46% x 45%

      • Duração da doença (dias) 307±564 x 258±501 x 365±570 x 255±436

      • Sintomas cranianos 78% x 82% x 80% x 78%

      • Polimialgia reumática 59% x 64% x 60% x 69%

      • VHS 24,6±18,7 x 20,8±18,1 x 28,8±25,4 x 24,2±18,2

      • Diagnóstico

        • Biópsia Artéria Temporal 57% x 68% x 72% x 57%

        • Imagem positiva 50% x 46% x 38% x 45% 

    • 216 pacientes completaram o estudo até a semana 52 (86%)

    • 250 pacientes foram avaliados para desfechos por “intention to treat” modificado, pois um paciente no grupo TCZ a cada 2 semanas não iniciou a medicação 

    Resultados:

    •  A remissão sustentada sem o uso de glicocorticoides foi significativamente maior nos grupos tratados com tocilizumabe (TCZ) comparado aos grupos placebo, com 56% no grupo TCZ semanal e 53% no grupo TCZ quinzenal, em comparação com 14% no grupo placebo com desmame em 26 semanas e 18% no grupo placebo com desmame em 52 semanas (p<0,001). 

    • No entanto, não houve diferença significativa entre o grupo TCZ quinzenal e o grupo placebo com desmame em 52 semanas.

    • Todos os desfechos secundários foram alcançados no grupo tocilizumabe semanal

    • A porcentagem de flares foi significativamente menor nos grupos em uso de tocilizumabe. TCZ semanal 23% x TCZ a cada 2 semanas 26% x PBO 26 semanas 68%  x PBO 52 semanas 49%. TCZ semanal vs PBO 26 semanas - HR 0,23 (IC 99% de 0,11-0,46). TCZ a cada 2 semanas vs PBO 26 semanas - HR 0,28 (IC 99% 0,12-0,66). 

    • O tratamento com tocilizumabe foi associado com uma redução na dose cumulativa de prednisona durante o período de 52 semanas. TCZ semanal 1862 mg (IC 95% 1582 - 1942); TCZ a cada 2 semanas 1862 mg (IC 95% 1568 - 2240); PBO 26 semanas 3296 mg (IC 95% 2730 - 4024); PBO 52 semanas 3818 mg (IC 95% 2818 - 4426)

    • Em pacientes com recaída (131 pacientes), o grupo TCZ semanal foi superior na prevenção de flares, quando comparado aos grupos PBO 26 semanas e PBO 52 semanas. Mas o grupo TCZ a cada 2 semanas não foi superior a nenhum dos grupos placebo em relação ao risco de recaídas. 

    • Em pacientes com diagnóstico novo (119 pacientes), o uso de tocilizumabe (semanal e a cada 2 semanas) foi superior na prevenção de flares quando comparado com PBO com desmame em 26 semanas (HR [IC 99% 0.25 (0.09, 0.70)] e [0.20 (0.05, 0.76)]). Nenhum dos grupos tocilizumabe foi superior na prevenção de flares quando comparados com o grupo placebo com desmame em 52 semanas (HR IC 99% 0.44 (0.14, 1.32) e 0.35 (0.09, 1.42).

    • Os grupos tocilizumabe registraram aumento na escala funcional SF-36, enquanto o escore diminuiu (indicando piora) nos grupos placebo

    • Menos pacientes reportaram efeitos adversos sérios nos grupos tocilizumabe quando comparados com os grupos placebo. TCZ semanal 15% x TCZ a cada 2 semanas 14% x PBO 26 semanas 22% x PBO 52 semanas 25%. 

    • O efeito adverso mais frequentemente reportado foi infecção

    • Um episódio de neuropatia óptica isquêmica anterior, com perda visual, aconteceu no grupo TCZ a cada 2 semanas, que resolveu com corticoide. 

    Conclusões:

    • O uso de tocilizumabe (semanal ou a cada 2 semanas), em combinação com uma retirada de prednisona em 26 semanas foi superior ao placebo em combinação com desmame de corticoide em 26 semanas e ao placebo em combinação com desmame de corticoides em 52 semanas, na manutenção de remissão sustentada em pacientes com arterite de células gigantes. 

    Pontos Fortes:

    • Estudo randomizado, o que diminui o efeito de fatores de confusão

    • Multicêntrico, o que aumenta a validade externa

    • Amostra com tamanho adequado, visto a raridade da arterite de células gigantes

    • Representatividade adequada de pacientes com diagnóstico novo e pacientes previamente diagnosticados com recaída

    • Cegamento adequado, anulando o efeito placebo e evitando viés de aferição.  

    Pontos Fracos:

    • O tempo de duração do estudo é curto para avaliar desfechos duros, que são eventos clínicos objetivos, como eventos cardiovasculares graves e mortalidade.

    • Não há medidas de desfecho validadas especificamente para avaliar a arterite de células gigantes em ensaios clínicos. Para contornar essa limitação, o estudo utilizou definições rigorosas de recaída (flare) e remissão, mas a ausência de ferramentas validadas pode afetar a precisão e a comparabilidade dos resultados.

    • O tocilizumabe, ao inibir a interleucina 6, normaliza a proteína C reativa, parâmetro importante na avaliação de recaídas durante o tratamento.


    Autor do conteúdo

    CARLOS ECHAURI


    Referências

    Públicação Oficial

    https://app.doctodoc.com.br/conteudos/tocilizumabe-na-arterite-de-celulas-gigantes


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