Terapia com Agalsidase-Beta para Doença de Fabry Avançada
26 de dezembro de 2024
6 minutos de leitura
A terapia com agalsidase-beta retarda a ocorrência de eventos renais, cardiovasculares, cerebrovasculares e morte em pacientes com doença de Fabry avançada?
A doença de Fabry é uma condição rara ligada ao X, causada pela deficiência da enzima lisossomal α-galactosidase A (α-Gal A). O acúmulo de substratos como globotriaosilceramida afeta células endoteliais do rim e do coração, provocando dor crônica, crises severas, anidrose, sintomas gastrointestinais e complicações graves, como insuficiência renal e doenças cardiovasculares, frequentemente levando à morte precoce entre 40 e 50 anos. Dois ensaios clínicos em pacientes com Fabry demonstraram que a reposição enzimática com agalsidase beta elimina a globotriaosilceramida do endotélio capilar do rim, coração e pele. Com base nos resultados destes ensaios, a agalsidase beta foi aprovada na Europa em 2001 e nos Estados Unidos pela FDA no âmbito do seu programa de aprovação acelerada, em 2003. Uma vez que a aprovação se baseou num marcador substituto, o FDA exigiu um ensaio adicional para demonstrar o benefício clínico. Por isso, realizou-se este ensaio clínico com o objetivo de avaliar o efeito da agalsidase beta na progressão da doença, por meio de uma análise de tempo até evento, e na ocorrência de eventos renais, cerebrovasculares, cardíacos ou morte em pacientes com doença de Fabry avançada.
Ensaio clínico randomizado
Multicêntrico – 9 centros na Europa e Estados Unidos
Duplo-cego
Controlado por placebo
Período de tratamento: até 35 meses
Estimou-se que uma amostra de 80 pacientes seria capaz de fornecer ao estudo 80% de poder para detectar um efeito de tratamento com base em testes log-rank usando uma taxa de abandono de 10%
Randomização na razão 2:1 – um grupo foi submetido à tratamento com agalsidase beta e outro submetido ao placebo.
Pacientes adultos com doença de Fabry avançada, com disfunção renal leve a moderada, selecionados entre 2001 e 2004.
Idade ≥ 16 anos de idade
Atividade de α-Gal A inferior a 1,5 nmol/h por mL de plasma (média normal, 8,1 nmol/h por mL de plasma) ou inferior a 4 nmol/h por mg de proteína leucocitária (média normal, 97,5 nmol/h por mg de proteína leucocitária)
Ausência de terapia de reposição enzimática prévia
2 medições consecutivas de creatinina sérica ≥1,2 mg/d e <3,0 mg/dL. Se a medição de creatinina sérica fosse <1,2 mg/dL uma depuração de creatinina <80 mL/min (Equação de Cockcroft-Gault) era requerida.
Pacientes em terapia dialítica ou programados para transplante renal
Ataques isquêmicos transitórios (AIT) documentados, acidente vascular cerebral (AVC) isquêmico, angina instável ou infarto do miocárdio dentro de 3 meses após a entrada no estudo.
Presença de condições confundidoras ou outras condições comórbidas clinicamente significativas.
Infusão intravenosa de agalsidase beta (1 mg/ kg de peso corporal) a cada 2 semanas
Placebo (solução tampão de manitol).
As infusões em ambos os grupos foram feitas com uma taxa inicial de 0,25 mg/min, aumentadas após a oitava infusão para reduzir o tempo para 90 minutos, conforme tolerado. Pré-tratamento com paracetamol ou ibuprofeno, e anti-histamínico em alguns casos, foi realizado para minimizar reações adversas à infusão.
Pacientes poderiam ser transferidos para o grupo agalsidase beta após confirmação de evento primário por um conselho independente.
Primário: tempo até o primeiro evento clínico (composição de evento renal, cardíaco, cerebrovascular ou morte).
Segurança: efeitos do tratamento avaliados em subgrupos estratificados para cada uma das 3 medidas basais da função renal (taxa de filtração glomerular – TFG, proteinúria e creatinina sérica).
MasculinoFeminino
Grupo Agalsidase Beta (N=51) x Grupo Placebo (N=31):
Idade (anos): 46,9 x 44,3
Peso médio (kg): 70,5 x 70,2
Altura média (cm): 173,2 x 172,8
Brancos: 88% x 87%
Negros: 2% x 0%
História de AIT ou AVC: 14% x 13%
História de doença cardíaca: 31% x 36%
Tratamento com inibidores da ECA ou BRA antes ou durante avaliação inicial: 35% x 36%
Proteinúria média: 1,5 x 1,1
Globotriaosilceramida sérica (média) – em µg/ml: 9 x 9,1
Taxa de filtração glomerular - TFG (média) – em ml/min/1,73 m²: 53 x 52,4
Pressão arterial sistólica média (mmHg): 126 x 128
Pressão arterial diastólica média (mmHg): 77 x 75
A terapia com agalsidase-beta demonstrou um efeito benéfico ao reduzir o risco de eventos clínicos em comparação ao placebo, especialmente em subgrupos específicos. Pacientes com taxas de filtração glomerular (TFG) maiores que 55 mL/min/1,73 m² apresentaram um efeito mais pronunciado do tratamento, com uma redução significativa no risco de eventos clínicos (HR, 0,19; IC, 0,05-0,82; P = 0,025). Por outro lado, aqueles com TFGs ≤ 55 mL/min/1,73 m² não apresentaram benefício significativo (HR, 0,85; IC, 0,32-2,3; P = 0,75).
Pacientes com níveis basais de creatinina sérica ≤ 1,5 mg/dL também tiveram maior benefício (HR, 0,25; IC, 0,07-0,90; P = 0,034), enquanto os com níveis superiores a 1,5 mg/dL não mostraram resultados significativos (HR, 0,80; IC, 0,29-2,21; P = 0,66).
A análise de proteinúria basal revelou diferenças pouco expressivas. Pacientes com proteinúria ≤ 1 apresentaram uma redução no risco de eventos clínicos (HR, 0,41), mas os resultados não atingiram significância estatística (IC, 0,13-1,3; P = 0,13).
Na análise geral, 42% dos pacientes do grupo placebo (13 de 31) e 27% do grupo agalsidase-beta (14 de 51) apresentaram eventos clínicos. A análise de intenção de tratar sugeriu um benefício com agalsidase-beta, mas sem atingir significância estatística (HR, 0,47; IC, 0,21-1,03; P = 0,06).
Por fim, 99% dos participantes relataram eventos adversos, como rinite, tosse ou dor de cabeça, com frequências semelhantes entre os grupos, indicando que a maioria dos eventos adversos não estava relacionada ao tratamento.
A terapia com agalsidase-beta retardou eventos renais, cardíacos, cerebrovasculares e morte, em pacientes com doença de Fabry avançada, especialmente em pacientes com taxa de filtração glomerular (TFG) > 55 mL/min/1,73 m² e creatinina sérica ≤ 1,5 mg/dL
Estudo multicêntrico e duplo-cego.
Incluiu pacientes com disfunção renal devido à Doença de Fabry, proporcionando dados relevantes para tratar uma população com maior risco de progressão da doença.
Foco em desfechos clínicos como principal objetivo, conferindo alta relevância para a prática clínica.
Avaliou apenas pacientes de centros na Europa e Estados Unidos, por isso, não se pode generalizar seus resultados às populações latino-americanas.
Utilizou desfecho composto como desfecho primário, o que reduz a clareza sobre quais componentes do desfecho foram mais impactados.
A inclusão de apenas pacientes com doença avançada limita a aplicação dos resultados para pacientes em estágios mais precoces da doença.
Autor do conteúdo
Carolina Ferrari
Referências
Públicação Oficial
https://app.doctodoc.com.br/conteudos/terapia-com-agalsidase-beta-para-doenca-de-fabry-avancada
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