Semaglutida Semanal em Pessoas com Obesidade e Osteoartrite de Joelhos
26 de dezembro de 2024
7 minutos de leitura
A semaglutida é eficaz na redução da dor em pacientes com osteoartrite de joelhos, quando comparada a placebo?
A osteoartrite (OA) de joelhos é uma condição altamente prevalente, que traz grandes prejuízos à qualidade de vida e que carece, até hoje, de medicamentos modificadores do curso da doença. Dentre os fatores de risco reconhecidos para o desenvolvimento e para a progressão da OA destaca-se a obesidade, e a redução do peso já foi associada à melhora da dor, da função e da rigidez articular em pacientes com OA. A semaglutida é um agonista do receptor do peptídeo glucagon-símile 1 (GLP-1) que vem sendo utilizado com sucesso para o tratamento da obesidade em pessoas com IMC ≥30 ou IMC ≥27 com pelo menos uma comorbidade relacionada ao excesso de peso. Portanto, este estudo teve como objetivo avaliar a eficácia da semaglutida na redução do peso e da dor relacionada à OA de joelhos em pacientes com obesidade de OA clínica e radiográfica.
Ensaio clínico randomizado
Multicêntrico (61 centros em 11 países)
Duplo cego
Controlado por placebo
Randomização 2:1 em blocos de 6 sem fatores de estratificação
As análises gerais foram feitas por intenção de tratar (todos os pacientes randomizados foram incluídos), e as análises de segurança incluíram os pacientes randomizados que receberam pelo menos uma dose de semaglutida ou placebo.
A amostra foi desenhada para avaliar dois desfechos primários, com um nível de significância global de 5%, sendo dividido entre os dois desfechos: 1% para a mudança no peso corporal e 4% para a mudança no escore WOMAC de dor.
As análises incluíram a previsão de perdas de dados e utilizaram imputação múltipla para compensar a falta de informações em alguns casos.
Pacientes com OA de joelhos clínica e radiográfica e IMC ≥30 kg/m2 incluídos entre 2021 e 2022
Diagnóstico clínico de OA de joelhos de acordo com os critérios do Colégio Americano de Reumatologia;
Alterações radiográficas moderadas (Kellgren-Lawrence graus 2 ou 3);
Dor relacionada à OA, com escore de dor WOMAC (Western Ontario and McMaster Universities Osteoarthritis Index) de pelo menos 40 (em uma escala de 0 a 100) na randomização.
Tratamento com outras medicações antiobesidade;
Uso de opioides no início do estudo.
Semaglutida subcutânea semanal na dose inicial de 0,24 mg/semana, com aumento semanal até 2,4 mg/semana na semana 16.
Placebo visualmente idêntico à semaglutida.
Todos os participantes receberam aconselhamento sobre dieta reduzida em calorias e atividade física durante o estudo.
Paracetamol poderia ser usado para manejo de dor na dose máxima de 4g/dia, mas deveria ser interrompido entre 24 e 72 horas antes das visitas do estudo. Nenhuma medicação para dor foi permitida nas 24 horas antes das visitas.
Primário: redução percentual do peso corpóreo e variação no escore WOMAC de dor.
Secundários: percentual de pacientes com redução de pelo menos 5% e 10% do peso corpóreo; variação nos escores WOMAC de função física, de rigidez articular e total; variação na qualidade de vida de acordo com o SF-36; variação na circunferência abdominal; intensidade da dor (em uma escala numérica); uso de medicações analgésicas.
MasculinoFeminino
Semaglutida (N=271) x Placebo (N=136)
Idade: 56 x 56
Sexo feminino: 84,1% x 76,5%
Raça branca: 62% x 58,8%
IMC (kg/m2): 40,5 x 40,0
Circunferência abdominal (cm): 118,3x 119,7
Escore de dor WOMAC inicial: 72,8 x 67,2
Pacientes no grupo semaglutida tiveram maior perda de peso na semana 68 em relação ao baseline do que pacientes no grupo placebo (-13,7% x -3,2%, diferença estimada -10,5%, IC 95% -12,3 a -8,6, P<0,001).
Pacientes no grupo semaglutida tiveram maior redução no escore de dor WOMAC na semana 68 em relação ao baseline do que pacientes no grupo placebo (-41,7 pontos x -27,5 pontos, diferença estimada -14,1 pontos, IC 95% -20 a -8,3, P<0,001).
O percentual de pacientes com redução de pelo menos 5% e 10% do peso corpóreo na semana 68 foi maior no grupo semaglutida.
Pacientes do grupo semaglutida tiveram maior variação na escala WOMAC de função física, de rigidez articular e total, bem como maior redução na escala numérica de dor.
Pacientes do grupo semaglutida obtiveram maior ganho no SF-36 (12 x 6,5 pontos, diferença estimada de 5,6 pontos, IC 95% 3,1-8,0, P <0,001).
O percentual de pacientes em uso de AINEs ou paracetamol reduziu nos dois grupos durante o estudo, mas de forma mais intensa no grupo semaglutida.
A taxa de efeitos adversos graves foi similar entre os grupos (10% no grupo semaglutida e 8,1% no grupo placebo).
Semaglutida mostrou-se superior a placebo na redução da dor relacionada à OA e do peso corporal em pacientes com OA de joelhos e obesidade.
O estudo foi metodologicamente apropriado para a avaliação dos desfechos, e a amostra de pacientes foi representativa.
O desfecho primário (dor relacionada à OA pelo escore WOMAC) foi adequado e é um desfecho de interesse, por tratar-se da principal manifestação clínica da OA, responsável por seu grande impacto negativo na qualidade de vida dos pacientes.
A utilização de imputação múltipla para lidar com dados ausentes é uma estratégia estatística que reduz possíveis vieses decorrentes de perdas de seguimento.
A alocação de maior peso estatístico no desfecho primário (4% do nível de significância global) escore WOMAC de dor reflete uma decisão acertada e alinhada com os objetivos clínicos do estudo. Já que a redução de peso corporal é um efeito sabido e esperado da semaglutida.
O estudo não foi controlado para a prática de atividade física entre os grupos, e o fortalecimento muscular é o pilar fundamental do tratamento da osteoartrite.
Não foi feita avaliação evolutiva da composição corporal dos pacientes, e uma das preocupações decorrentes do uso da semaglutida é a perda de massa muscular que ela pode acarretar.
O desenho do estudo não permite explorar o mecanismo pelo qual a semaglutida leva à melhora dos sintomas na OA de joelhos – se é apenas consequência da redução da carga mecânica sobre as articulações ou se há algo específico sobre a ação dos análogos do GLP-1. Para isto, estudos comparando semaglutida a outras intervenções que acarretem perda de peso equiparável (por exemplo, cirurgia bariátrica) ou analisando o efeito da semaglutida na osteoartrite de articulações de menor carga, como as mãos, seriam interessantes.
Não houve avaliação evolutiva de exames de imagem articulares, o que seria interessante para estudar um possível efeito da semaglutida na progressão estrutural da OA.
Autor do conteúdo
Marília Furquim
Referências
Públicação Oficial
https://app.doctodoc.com.br/conteudos/semaglutida-semanal-em-pessoas-com-obesidade-e-osteoartrite-de-joelhos
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