Satralizumabe no Tratamento de Neuromielite Óptica
12 de dezembro de 2024
6 minutos de leitura
O satralizumabe adicionado ao tratamento imunossupressor reduz o risco de surtos em pacientes com neuromielite óptica?
A neuromielite óptica (NMOSD) é uma doença autoimune rara que causa lesões inflamatórias no nervo óptico, medula espinhal, tronco encefálico e cérebro, com sintomas como perda visual, paralisia, disfunção vesical, náusea, vômito, soluços, dor e fadiga. Cerca de dois terços dos pacientes apresentam anticorpos contra a aquaporina-4 (AQP4-IgG), e níveis elevados de interleucina-6 (IL-6) também contribuem para a patogênese da doença. Medicamentos imunossupressores são usados off-label para prevenir surtos, já que tratamentos tradicionais para a esclerose múltipla podem ser prejudiciais para NMOSD. Embora a IL-6 seja reconhecida como um alvo terapêutico, faltam dados robustos sobre a eficácia de inibidores da IL-6, como o satralizumabe, especialmente em combinação com imunossupressores. Portanto este estudo foi realizado para preencher essa lacuna, avaliando se o satralizumabe combinado a imunossupressores pode reduzir surtos e controlar a progressão da doença em pacientes com NMOSD.
Ensaio clínico randomizado
Multicêntrico (34 centros em 11 países)
Duplo cego
Controlado por placebo
Randomização (1:1, estratificado de acordo com a taxa basal de surtos anuais (1 vs. >1) e região (Asia vs. Europa e outros).
O cálculo amostral visou 80% de poder estatístico com nível de significância de 5%. Pressupostos: redução de 66,5% no risco de recaída (HR: 0,335), taxa de recaída no placebo de 0,4184, e desistência de 10% em dois anos. Foram estimados 26 eventos de recaída para a análise primária, com recrutamento de 70 pacientes (35 por grupo).
Pacientes adultos e adolescentes com diagnóstico de neuromielite óptica soropositivos ou soronegativos para anticorpos anti-aquaporina-4.
Diagnóstico de NMO AQP4-IgG–soropositiva ou AQP4-IgG–soronegativa (* limitada a 30% do total a porcentagem de soronegativos), conforme definido por critérios revisados de 2006 (aqui chamados apenas de NMO), OU
NMOSD AQP4-IgG–soropositiva, aqui definido como sorologia positiva mais eventos idiopáticos únicos ou recorrentes de mielite longitudinal extensa (lesões da medula espinhal envolvendo ≥3 segmentos vertebrais na ressonância magnética) ou neurite óptica recorrente ou simultânea em ambos os olhos (aqui chamados NMOSD, ou seja, transtorno do espectro da neuromielite óptica).
Tratamentos anteriores com agentes direcionados à via da interleucina-6, alemtuzumabe, irradiação corporal total ou transplante de medula óssea.
Uso nos últimos 6 meses de eculizumabe, belimumabe ou tratamentos modificadores da doença para esclerose múltipla.
Uso nos últimos 2 anos de agentes anti-CD4, cladribina ou mitoxantrona.
Satralizumabe 120 mg por via subcutânea nas semanas 0, 2 e 4 e, posteriormente, a cada 4 semanas.
A intervenção foi planejada para ser administrada durante o período duplo-cego até que ocorressem 26 recaídas protocoladas, conforme determinado pelos cálculos de amostra e poder do estudo. Após essa etapa, os pacientes poderiam entrar em um período de extensão aberta, onde todos recebiam satralizumabe de forma continuada.
Placebo na mesma frequência de doses
O tratamento de base com uma dose estável de azatioprina (máximo de 3 mg por quilograma de peso corporal por dia), micofenolato mofetil (máximo de 3000 mg por dia) ou glicocorticoides orais (máximo de 15 mg de prednisolona equivalente por dia) foi permitido em doses estáveis em ambos os grupos.
Primário: tempo até o primeira surto, definida como sintomas neurológicos novos ou agravados com duração superior a 24 horas e não atribuíveis a fatores clínicos, acompanhados por:
Aumento de pelo menos 1,0 no EDSS (total) a partir de uma pontuação basal > 0 (ou aumento de ≥2,0 a partir de uma pontuação basal de 0).
Aumento de pelo menos 2,0 em sistema piramidal, cerebelar, tronco encefálico, sensorial, intestinal ou urinário, ou de um único olho.
Aumento de pelo menos 1,0 em mais de uma pontuação funcional para sintomas com pontuação basal ≥1,0.
Aumento de pelo menos 1,0 em uma pontuação funcional específica para sintomas de um único olho com pontuação basal ≥1,0.
Secundários: variação na semana 24 da escala visual analógica (VAS) para dor e da escala funcional (FACIT-F).
As medidas de segurança incluíram a incidência e a gravidade de eventos adversos e eventos adversos graves.
MasculinoFemininoundefined
Satralizumabe (N=41) x Placebo (N=42):
Idade: 40,8 / 43,4
Sexo feminino: 90% / 95%
Ásia: 39% / 43%
Europa ou outros: 61% / 57%
Neuromielite óptica: 80% / 67%
Transtorno do espectro da neuromielite óptica (NMOSD): 20% / 33%
AQP4-IgG–soropositivo: 66% /67%
Tratamento de base:
Glicocorticoides orais: 41% / 48%
Azatioprina: 39% / 31%
Micofenolato mofetil: 10% / 19%
Azatioprina + glicocorticoides: 7% / 0%
Micofenolato mofetil + glicocorticoides orais: 2% / 2%
O risco de recaída foi menor no grupo satralizumabe, com surtos ocorrendo em 20% dos pacientes, em comparação com 43% no grupo placebo (hazard ratio 0,38; IC de 95%, 0,16 a 0,88; P ajustado = 0,02). A porcentagem de pacientes livres de surtos em 48 semanas foi de 89% no grupo satralizumabe e de 66% no grupo placebo; em 96 semanas, 78% e 59%, respectivamente.
A variação na pontuação VAS para dor não teve resultado estatisticamente significativo (diferença entre grupos, 4,08; IC de 95%, −8,44 a 16,61; P = 0,52).
A variação do escore FACIT-F (fadiga) foi de −3,10 (IC de 95%, −8,38 a 2,18), também sem significância estatística.
A taxa anual de surtos foi menor no grupo satralizumabe (0,11 versus 0,32 no grupo placebo, diferença entre grupos, 0,34; IC de 95%, 0,15 a 0,77).
A eficácia do satralizumabe foi mais pronunciada entre os pacientes soropositivos para AQP4-IgG, com um efeito menos evidente nos soronegativos.
AQP4-IgG soropositivo - hazard ratio para surto 0,21 (IC 95%: 0,06 a 0,75).
11% no grupo satralizumabe tiveram surtos
43% no grupo placebo tiveram surtos
AQP4-IgG soronegativo - hazard ratio para surto 0,66 (IC de 95%, 0,20–2,24):
36% no grupo satralizumabe tiveram surto
43% no grupo placebo tiveram surto
A duração mediana do tratamento foi de 107,4 semanas no grupo satralizumabe e de 32,5 semanas no grupo placebo. Neste último, pacientes tiveram tempo mais curto até surto e uma maior desistência do estudo.
O número de eventos adversos graves, infecções e infecções graves foi semelhante entre os grupos. Não houve mortes nem reações anafiláticas.
O satralizumabe, quando adicionado a imunossupressores padrão, demonstrou reduzir significativamente o risco de surtos em pacientes com neuromielite óptica espectral, especialmente em indivíduos soropositivos para anticorpos anti-aquaporina-4.
Uso de escala funcional EDSS como desfecho primário haja vista capacidade de avaliação dos diversos sistemas funcionais.
Estratificação da randomização de acordo com frequência de surtos.
Uso concomitante de outros imunossupressores (em especial glicocorticoides orais) o que aproxima o estudo da “vida real”.
Altas taxas de perda de informação e desistências (24%) no grupo placebo.
No subgrupo AQP4-IgG–soronegativo, a taxa de surto foi próxima à do grupo placebo (36% vs. 43%), com um hazard ratio de 0,66 (IC de 95%, 0,20–2,24). O resultado pode estar relacionado a menor eficácia do medicamento nesse subgrupo ou à baixa inclusão de pacientes soronegativos.
Embora ambos os grupos usassem terapias imunossupressoras padrão, não foi avaliado o efeito do satralizumabe como monoterapia ou em comparação direta.
Autor do conteúdo
Fernando Falcão
Referências
Públicação Oficial
https://app.doctodoc.com.br/conteudos/satralizumabe-no-tratamento-de-neuromielite-optica
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