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    Reabilitação Cardíaca Híbrida Precoce em Cardiopatia Congênita

    03 de setembro de 2024

    7 minutos de leitura

    Pergunta:

    • A reabilitação cardíaca híbrida precoce em pacientes com cardiopatia congênita melhora a qualidade de vida em comparação com o tratamento convencional? 

    Background:

    A capacidade cardiopulmonar em pacientes com cardiopatia congênita diminui mais rapidamente do que na população em geral, resultando em um prejuízo da qualidade de vida. No entanto, o cuidado padrão oferecido parece ser insuficiente para encorajar e manter a capacidade cardiopulmonar nesse perfil de pacientes.

    Dessa forma, foi realizado o estudo QUALIREHAB com o objetivo de avaliar se a reabilitação cardíaca híbrida precoce, que combina sessões presenciais e remotas, é mais eficaz do que o tratamento convencional na melhoria da qualidade de vida e da capacidade funcional em pacientes com cardiopatia congênita.

    Desenho do Estudo:

    • Ensaio clínico randomizado 

    • Multicêntrico (12 centros de cardiopatia congênita e 9 centros de reabilitação cardíaca na França)

    • Aberto

    • O estudo foi desenvolvido para ter 80% de poder para detectar uma diferença absoluta de 7 pontos na mudança auto reportada do escore de qualidade de vida relacionada à saúde (HRQoL), com um risco alfa-bilateral de 5%. Para alcançar essa conclusão, eram necessários pelo menos 142 pacientes, considerando um potencial de 20% de perda de seguimento e/ou dados faltantes para o desfecho primário.

    População:

    • Pacientes adolescentes e jovens adultos com cardiopatia congênita incluídos entre 2018 e 2021.

    Critérios de Inclusão:

    • Idade entre 13 e 25 anos

    • Teste cardiopulmonar do exercício realizado nos últimos 3 meses, com VO2 máximo < 80% do predito ou limiar anaeróbico ventilatório < 55% do VO2 máximo predito.

    • Assinatura do termo de consentimento informado pelos pacientes adultos ou pelos guardiões legais para pacientes adolescentes.

    Critérios de Exclusão:

    • Cirurgia cardíaca planejada durante o estudo.

    • Pacientes submetidos à programa de reabilitação cardíaca nos últimos 24 meses

    • Arritmias não controladas

    • Bloqueio atrioventricular avançado

    • Insuficiência cardíaca descompensada (NYHA IV)

    • Hipertensão não controlada

    • Pericardite ou miocardite aguda

    • Estenose aórtica sintomática

    • Cardiomiopatia hipertrófica obstrutiva grave

    • Doença sistêmica aguda

    • Trombo intracardíaco recente (< 3 meses), embolismo ou tromboflebite

    Intervenção:

    • Reabilitação híbrida

      • Sessões presenciais semanais de exercício supervisionado

      • Sessões remotas de exercício monitorado via telemedicina

      • Duração total da intervenção: 12 semanas

    Controle:

    • Tratamento padrão de rotina 

    Outros Tratamentos e Definições:

    • O programa de reabilitação consistia em exercícios intervalados diários de 1 hora, supervisionados individualmente por um educador físico, utilizando bicicleta estacionária e monitoramento da frequência cardíaca. Adicionalmente, os pacientes realizavam atividades aeróbicas variadas para manter a motivação. O programa incluía também sessões de educação multidisciplinar com psicólogos, nutricionistas e enfermeiras. Entre a Semana 2 e a Semana 12, o treinamento domiciliar ocorria duas vezes por semana: uma sessão presencial e outra por videoconferência, seguindo o mesmo protocolo do centro de reabilitação.

    Desfechos:

    • Primário: mudança auto reportada no escore de qualidade de vida relacionada à saúde (HRQoL), usando o questionário PedsQL 4.0, desde a avaliação inicial até o mês 12.

    • Secundários: mudança desde a avaliação inicial até o mês 12 de follow-up em parâmetros cardiovasculares (IMC, pressão arterial e frequência cardíaca), saúde física, saúde mental e o nível de conhecimento sobre a doença.

    Características dos Pacientes:

     

    Masculino (47.8% Masculino)Feminino (52.2% Feminino)
    Masculino
    Feminino

     

    • Grupo Intervenção (N=70)  x Grupo Controle (N=70):

    • Idade (anos): 17,1± 3,5x 16,9 ± 3,1

    • IMC (kg/m²) : 21,8±3,6  x  20,9±4

    • Frequência cardíaca de repouso (bpm): 84.8±18.6 x  82,9±14.7

    • Pressão arterial de repouso (mmHg)

      • Pressão arterial sistólica: 119,5± 17,4  x  116,5±15,4

      • Pressão arterial diastólica: 68,6±12,3  x  69±12,8

    • Classe funcional (NYHA)

      • I : 55% x 54%

      • II: 43% x 42%

      • III: 2% x 4%

    • Tipo de cardiopatia congênita:

      • Transposição de grandes artérias: 7% x 6%

      • Defeito septal atrial: 13% x 7%

      • Defeito septal ventricular: 17%  x 10%

      • Defeito conutruncal: 21%  x 37%

      • Doença válvula aórtica: 7% x 7%

      • Doença válvula pulmonar: 3%  x 7%

      • Coarctação da aorta: 12% x 7%

      • Coração univentricular: 13% x 7%

      • Defeito septal atrioventricular: 3% x 7%

      • Outros: 4%  x  5%

    • Cirurgias cardíacas: 

      • Zero: 19%  x  14%

      • Uma: 51%  x  36%

    • Parâmetros do teste cardiopulmonar: 

    Espirometria

    • FEV1 (L): 2,79±0,85  x   2,76±0,84

    • FVC (L): 3,31±1,1 x 3,29±0,99

    • FEV1/FVC (%): 85,01±9,53  x  84,6±11,08

    Parâmetros submáximos:

    • Limiar anaeróbico ventilatório (ml/kg/min): 17,6±3,8 x 17,5±4,4

    • Percentagem do predito (limiar anaeróbico ventilatório): 45±10,7 x 44±10,4

    • Frequência cardíaca (limiar anaeróbico ventilatório): 128,6±20,2 x 128,7±22,9

    • Carga de trabalho (limiar anaeróbico ventilatório): 73,5±28,4 x 69,7±25,2

    • VE/VCO2 slope: 32,2±6,9 x 32,5±6.1

    Parâmetros máximos

    • VO2 máximo (ml/kg/min): 27,3±5,9 x 27,1±6,4

    • Percentagem do predito do VO2 máximo: 69,5±10,6 x 67,9±14,3

    • Frequência cardíaca máxima: 172±22,4 x 168,7±24

    • Carga de trabalho máximo (W): 127,7±43,7 x 127,7±34,7

    • Pulso de oxigênio máximo (ml/batimento): 9,48±2,83 x 9,12±2,47

    • Desfechos de saúde mental: 

      • Sintomas de ansiedade em adolescentes (STAI-C), escore total variando entre 20 – 60:  31,9±6,9  x  35,2±8,6

    • Sintomas de ansiedade em jovens adultos (STAI), escore total variando entre 20-80: 44,2±13,5 x  40,7±9,1

    • Sintomas de depressão em adolescentes (CDI), escore total variando entre 0- 54: 10,4±6,3 x 12,7±7,5

    • Sintomas de depressão em jovens adultos (BDI), escore total variando entre 0-63: 5,9±5,9 x 4,8±2,9

    Resultados:

    • A mudança auto reportada no escore de qualidade de vida relacionada à saúde desde a avaliação inicial até o mês 12 diferiu significativamente entre os grupos, com uma diferença média de 3,8 (95% IC 0.2; 7.3; p=0,038, tamanho do efeito 0.34), a favor do grupo de reabilitação cardíaca (grupo intervenção). 

    • Essa diferença também foi observada na saúde física auto reportada, com uma diferença média de 4,7 (95% IC 0.4; 9, p=0,033, tamanho do efeito 0,36), e na funcionalidade social auto reportada, com uma diferença média de 6,7 (95% IC 1.7;11.7, p=0.009, tamanho do efeito 0,42).

    • Os pacientes alocados no grupo intervenção apresentaram melhora no IMC, com uma diferença média de – 0,7 kg/m² (95% IC – 1.3; -0.1, p=0.022, tamanho do efeito 0.41); no nível auto reportado de atividade física, com uma diferença média de 2.5 (95% IC 0.1 ;5, p=0.044, tamanho do efeito de 0.39); e no nível de conhecimento sobre a doença, com uma diferença média de 2.7 (95% IC 0.8; 4.6, p=0,007, tamanho do efeito de 0.51).

    • Em adolescentes alocados no grupo intervenção, observou-se uma tendência de queda de sintomas ansiosos (diferença média -2.33, 95% IC – 4.88;0.21, p=0.07, tamanho do efeito 0.41) e de sintomas depressivos (diferença média – 2.44, 95% IC -5.01;0.13, p=0.06, tamanho do efeito 0.45).

    • Nenhuma diferença significativa foi observada nos parâmetros de capacidade cardiopulmonar entre a avaliação inicial e o mês 12 de follow-up.

    Conclusões:

    • O programa de reabilitação cardíaca híbrido QUALIREHAB melhorou a qualidade vida em adolescentes e jovens adultos portadores de cardiopatia congênita.

    Pontos Fortes:

    • O estudo avaliou o impacto de uma intervenção não medicamentosa sobre os parâmetros de qualidade de vida e saúde cardiovascular em uma população de pacientes com cardiopatia congênita, que são pouco representados em estudos clínicos.

    • A utilização de critérios de inclusão objetivos (capacidade funcional medida pelo teste cardiopulmonar de exercício) eliminou potenciais vieses de seleção, aumentando a validade dos resultados.

    • A inclusão de pacientes com vários tipos de cardiopatia congênita, desde as formas mais simples até as mais complexas, como o coração univentricular, amplia a aplicabilidade dos resultados.

    • Houve uma distribuição equilibrada das características clínicas entre os grupos, minimizando o viés de tratamento e aumentando a confiabilidade dos achados.

    Pontos Fracos:

    •  O estudo teve um baixo número amostral, o que pode limitar a generalização dos resultados e reduzir o poder estatístico para detectar diferenças significativas.

    • O desfecho primário foi baseado em uma ferramenta subjetiva (mudança auto reportada no escore de qualidade de vida relacionada à saúde - HRQoL), o que pode comprometer a confiabilidade dos resultados devido à variabilidade inerente às percepções pessoais.

    • Não houve avaliação de outros parâmetros clínicos importantes, como alterações na hemoglobina glicada ou nos níveis de colesterol após a reabilitação, o que poderia fornecer uma visão mais abrangente dos benefícios da intervenção.

    • A fase domiciliar do programa de reabilitação utilizou o mesmo protocolo do centro de reabilitação, com bicicleta estacionária e supervisão de um educador físico, o que pode tornar a intervenção inacessível para a maioria da população mundial, limitando a aplicabilidade global do protocolo.


    Autor do conteúdo

    Carolina Ferrari


    Referências

    Públicação Oficial

    https://app.doctodoc.com.br/conteudos/reabilitacao-cardiaca-hibrida-precoce-em-cardiopatia-congenita


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