Manejo do Peso em Atenção Primária para Remissão de Diabetes Tipo 2
18 de fevereiro de 2025
7 minutos de leitura
O manejo intensivo e eficaz do peso realizado na atenção primária é capaz de atingir remissão sustentada do diabetes tipo 2?
O Diabetes mellitus tipo 2 (DM2) acomete cerca de 10% dos adultos no Reino Unido, e mais de 422 milhões de adultos mundialmente e promove complicações crônicas e maior morbidade, apresentando números progressivamente maiores na população mais jovem, principalmente naqueles com sobrepeso e obesidade, com aumento no risco de redução de sobrevida. O DM2 apresenta forte associação ao excesso de peso e ao acúmulo excessivo de gordura hepática e pancreática, com estudos demonstrando que um balanço energético negativo (600 – 700 kcal/dia) seria capaz de promover a redução da resistência insulínica e do conteúdo gorduroso no fígado, além de normalizar a secreção insulínica de primeira fase e a gordura pancreática em 8 semanas, bem como atingir estabilidade metabólica por 6 meses de ingesta isocalórica.
Estudos anteriores demonstraram que uma perda de peso de 10 a 15 kg está associada à normalização do perfil glicêmico em casos de DM2 de curta duração. Contudo, nenhum estudo baseado em intervenções dietéticas avaliou, até o momento, a remissão sustentada da doença (≥ 1 ano) como desfecho primário. Nesse contexto, o Diabetes Remission Clinical Trial (Estudo DiRECT) tem como objetivo determinar se o manejo eficaz do peso, realizado no âmbito da atenção primária, pode levar a uma remissão sustentada do DM2.
Ensaio clínico randomizado em clusters.
Aberto (open label), em 49 centros de atenção primária na Escócia e Inglaterra.
Randomização das clínicas em proporção 1:1 estratificado pela região.
Estudo não cegado (aberto). Os responsáveis pela análise estatística foram cegados quanto à alocação.
Análise estatística a nível individual, com princípio de intenção de tratar.
Estimou-se que 280 participantes seriam necessários para atingir um poder estatístico de 80%, assumindo a remissão de diabetes em 22% no grupo intervenção e em 5% no grupo controle em um ano, com inscrição de 10 participantes por clínica, e um coeficiente de correlação intra cluster de 0,05, além de uma taxa de saída do estudo de 25% em 12 meses.
Pacientes de clínicas gerais e de atenção primária, portadores de diabetes tipo 2 entre 2014 e 2016.
Idade entre 20 e 65 anos;
DM2 diagnosticado nos últimos 6 anos;
IMC entre 27 e 45 kg/m2;
Hemoglobina glicada (HbA1c) mais recente maior que 6% e, caso esteja menor que 6.5%, ainda deve estar em uso de medicamentos antidiabéticos.
Uso atual de insulina;
Hemoglobina glicada (HbA1c) ≥ 12%;
Perda ponderal ≥ 5 kg nos últimos 6 meses;
Doenças crônicas descompensadas ou graves;
Condições psiquiátricas associadas: abuso de substâncias; transtornos alimentares ou comportamento bulímico; admissão hospitalar por depressão ou uso de antipsicóticos
Diagnóstico de câncer;
Dificuldades com aprendizagem;
Tratamento com medicamentos para obesidade;
Programa de manejo do peso baseado em evidências (Counterweight-Plus).
Plano calórico dividido entre fase de reposição dietética total (indução da perda de peso) por 3 a 5 meses e uma fase de reintrodução alimentar por 2 a 8 semanas, seguido de um programa de visitas mensais (manutenção do peso a longo prazo).
Fase de reposição dietética total: fórmulas de baixa energia (825–853 kcal/dia; 59% carboidrato, 13% gordura, 26% proteína, 2% fibra). Os participantes foram encorajados a manter as atividades físicas usuais, mas sem estímulo para aumento de intensidade.
Fase de reintrodução alimentar: seguindo a proporção de 50% carboidrato, 35% gordura, 15% proteína. Foram iniciadas estratégias de atividade física e contabilização de passos, com um alvo máximo de 15.000 passos ao dia.
Objetivo de atingir e manter ao menos uma perda ponderal de 15 kg.
Todos os antidiabéticos orais e anti-hipertensivos foram suspensos no dia 1 do programa, com reintrodução conforme julgamento clínico.
Cuidados usuais baseados em diretrizes para tratamento de diabetes e obesidade.
Os participantes do grupo controle receberam um incentivo, através de um voucher de 50 libras na Amazon.
Ambos os grupos continuaram recebendo cuidados em diabetes conforme diretrizes e preconização da National Institute of Health and Care Excellence (Inglaterra) e da Scottish Intercollegiate Guidelines Network (Escócia)
Primários: redução de peso em ≥ 15 kg em 12 meses; remissão do diabetes (HbA1c < 6.5% após ao menos 2 meses sem uso de antidiabéticos) em 12 meses
Os desfechos primários foram analisados de forma hierárquica, com a perda de peso sendo avaliada primeiro.
Secundários: qualidade de vida; perfil lipídico; atividade física; aceitabilidade do programa; qualidade do sono; pressão arterial
MasculinoFeminino
298 pacientes | Feminino = 40% e Masculino 60%
49 clínicas: Intervenção = 23 x Controle = 23
Grupo Counterweight-Plus (N = 149) x Grupo controle (N = 149)
Sexo masculino: 56% x 62%
Etnia branca: 98% x 99%
Peso médio em kg: 101 x 98.8
IMC médio em kg/m2: 35.1 x 34.2
Tempo médio do diagnóstico de diabetes em anos: 3.0 x 3.0
HbA1c média em %: 7.7 x 7.5
Glicose em jejum média em mg/dL: 166,12 x 158,91
Número de antidiabéticos orais em uso:
0: 26% x 23%
1: 44% x 53%
≥ 2: 31% x 24%
Complicações microvasculares: 13% x 18%
O programa de manejo do peso baseado em evidências (Counterweight-Plus) foi associado a maior proporção de perda de 15kg ou mais e maior proporção de remissão de diabetes.
Gráfico 1
Gráfico 2
A redução média de peso foi de 10.0 kg no grupo intervenção, e de 1.0 kg no grupo controle (diferença ajustada – 8,8 kg, IC 95% - 10,3 a – 7,3, p < 0,0001).
No grupo intervenção, houve redução do peso em 14,5 kg (IC 95% 13,4 – 15,5) na fase de substituição dietética total, seguido por um ganho de 1,0 kg (IC 95% 0,3 a 1,6) durante a fase de reintrodução alimentar e de 1,9 kg (IC 95% 1,2 a 2,5) na fase de manutenção.
Pacientes que completaram as etapas propostas no grupo intervenção obtiveram maior perda ponderal e menos reganho de peso.
HbA1c média caiu em – 0,9% (desvio padrão de 1,4) na intervenção, e aumentou em 0,1% (DP 1,1) no controle (diferença ajustada – 0,85%, IC 95% - 1,1 a - 0,59; p < 0,001).
A remissão do diabetes não ocorreu nos pacientes que não perderam peso em 12 meses; ocorreu em 7% dos que mantiveram perda entre 0 e 5 kg; em 34% dentre os que tiveram perda de 5 a 10 kg; 57% dos participantes com perda de 10 a 15 kg; e em 86% do diabéticos que tiveram perda 15 kg ou mais.
Em 12 meses, 74% do grupo intervenção estavam sem uso de antidiabéticos orais (HbA1c média 6,4%), comparado a 18% do grupo controle (HbA1c média 7,2%).
O número médio de antidiabéticos orais prescritos reduziu no grupo intervenção e aumentou no grupo controle, com uma diferença no efeito da intervenção estimada de - 0,97, com IC 95% de - 1,11 a -0,84, p < 0,0001.
A qualidade de vida melhorou no grupo intervenção em relação ao grupo controle.
Anti-hipertensivos foram retirados em 48% dos participantes em uso no baseline no grupo intervenção. Nenhum foi retirado no grupo intervenção.
Em 12 meses de seguimento, 9 eventos adversos importantes foram reportados, sendo 7 do grupo intervenção e 2 no grupo controle. Não houve óbito.
Nenhum evento adverso importante levou à saída de participantes do estudo
Os efeitos adversos mais comuns durante a reposição dietética total foram constipação, maior sensibilidade ao frio, cefaleia e tontura. A maioria foi de intensidade leve ou moderada, desaparecendo com o tempo, sem necessidade de tratamento (exceto pela constipação).
O manejo intensivo e estruturado da perda de peso realizado na atenção primária foi capaz de atingir remissão sustentada do diabetes tipo 2.
Plano de intervenção claro e estruturado, baseado em evidências, permitindo uma análise quantitativa e sua relação de causa e efeito no desfecho
Pioneiro em estabelecer remissão de diabetes como um desfecho primário para análise
Intervenção pouco aplicável na maioria dos contextos de atendimento ao paciente.
Falta de poder para determinar efeitos em complicações do diabetes.
Características étnicas e raciais da população restringem a extrapolação para outros grupos – tais como asiáticos, latinos e afrodescendentes.
Limitação da coleta de dados, incluindo a análise detalhada da composição corporal
Autor do conteúdo
Andressa Leitao
Referências
Públicação Oficial
https://app.doctodoc.com.br/conteudos/manejo-do-peso-em-atencao-primaria-para-remissao-de-diabetes-tipo-2
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