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    Jejum versus Ausência de Jejum Antes de Procedimentos na Sala de Hemodinâmica

    06 de fevereiro de 2025

    6 minutos de leitura

    Pergunta

    • É seguro eliminar a exigência de jejum antes de procedimentos realizados na sala de hemodinâmica que requerem sedação leve?

    Background

    • Anualmente, milhões de pacientes são submetidos a procedimentos cardíacos com sedação consciente, geralmente precedidos por jejum de 6 horas para alimentos sólidos e 2 horas para líquidos claros, conforme recomendações para minimizar o risco de aspiração. Contudo, não há evidências que comprovem benefícios dessa prática, especialmente considerando o baixo risco de aspiração nesse contextoEstudos observacionais e um estudo unicêntrico de não-inferioridade indicam que a ausência de jejum é segura e aumenta a satisfação dos pacientes. Além disso, o jejum prolongado pode trazer efeitos adversos, como desconforto, desidratação, lesão renal aguda, hipotensão e controle glicêmico deficiente. Remover a exigência de jejum pode reduzir fome, sede, melhorar a satisfação dos pacientes e diminuir atrasos e cancelamentos dos procedimentos. O estudo SCOFF busca avaliar a segurança da ausência de jejum em comparação ao jejum tradicional antes de intervenções cardíacas que requerem sedação leve.

    Desenho do Estudo

    • Ensaio multicêntrico (6 centros na Austrália).

    • Pragmático, prospectivo e aberto para a intervenção e cegado para o desfecho. 

    • Estudo de não-inferioridade.

    • Randomizado em razão 1:1 em sequência única, estratificado por centro e pelo tipo de procedimento (procedimento coronariano e procedimento de dispositivos).

    • Foi utilizada estatística Bayesiana para determinar o tamanho amostral. Assumiu-se que o grupo sem jejum seria considerado não-inferior ao grupo com jejum se houvesse uma probabilidade de 95% ou mais de que a diferença entre os grupos fosse menor que 3% (margem de não-inferioridade). Para garantir 80% de chance de declarar corretamente a não-inferioridade, determinou-se a necessidade de incluir 300 pacientes em cada grupo. No entanto, o objetivo foi recrutar 700 pacientes ao total, sendo 600 para procedimentos coronarianos e 100 para dispositivos.

    • Caso o estudo fosse positivo para a não-inferioridade, foi previsto testar a superioridade para o desfecho primário.

    População

    • Pacientes encaminhados ao laboratório de hemodinâmica e que seriam submetidos à sedação leve entre 2022 e 2023.

    Critérios de Inclusão

    • 18 anos ou mais 

    • Encaminhados para angiografia coronariana, intervenção coronariana percutânea ou procedimento relacionado a dispositivos cardíacos implantáveis. 

    Critérios de Exclusão

    • Necessidade de anestesia geral.

    • Procedimentos de emergência.

    • Intervenções estruturais cardíacas, aterectomia ou litotripsia coronariana planejadas, estudos eletrofisiológicos e terapia de ressincronização cardíaca. 

    Intervenção

    • Sem requisitos de jejum.

      • Os pacientes eram incentivados a fazer as refeições habituais, mas não eram obrigados a fazê-las.

    Controle

    • Jejum de 6 horas para alimentos sólidos e de 2 horas para líquidos claros

    Demais tratamentos

    • Os pacientes em uso de i-SGLT2 e metformina foram orientados a suspender essas medicações 24 horas antes do procedimento e retomá-las após 48 horas. Para os pacientes em uso de insulina, no grupo sem jejum, a dose habitual foi mantida, enquanto no grupo com jejum houve a orientação de não aplicar a insulina de curta ação pela manhã, mas manter a dose da insulina de longa ação.

    • A sedação foi determinada pelo médico assistente, com a recomendação de utilizar fentanil e/ou midazolam, titulados conforme o efeito desejado.

    Desfechos

    • Primário: composto de pneumonia aspirativa relacionada ao procedimento, hipotensão, hiperglicemia e hipoglicemia

    • Secundários: cada componente do desfecho primário isoladamente; satisfação do paciente; nova necessidade de ventilação (não invasiva e invasiva); nova admissão na unidade de terapia intensiva; readmissão em 30 dias; mortalidade em 30 dias; pneumonia em 30 dias.

    Características dos Pacientes

     

    Masculino (65% Masculino)Feminino (35% Feminino)
    Masculino
    Feminino

     

    716 pacientes | Masculino = 65% e Feminino = 35%

    • Jejum (N=358) x Sem Jejum (N=358):

    • Idade média, em anos: 70 x 69

    • Sexo masculino: 64,5% x 65,9%

    • IMC (kg/m²): 29,6 x 29,6

    • Procedimento em paciente internado: 34,1% x 34,9%

    • Procedimento coronariano percutâneo: 83% x 85,5%

      • Procedimento diagnóstico: 69,7% x 63,1%

      • Intervenção coronária: 30,3% x 36,9%

      • Avaliação fisiológica: 6,4% x 9,5%

    • Procedimentos com dispositivos: 17% x 14,5%

      • Marca-passo: 65,6% x 53,8%

      • Desfibrilador: 14,8% x 7,8%

      • Revisão de eletrodo: 8,2% x 3,8%

      • Troca de gerador: 11,5% x 34,6%

    • Utilização de sedação: 87% x 89%

      • Dose média de midazolam utilizada: 1,3 mg x 1,2 mg

      • Dose média de fentanil utilizada: 40,3 mcg x 41,3 mcg

    • Tempo mediano de jejum de alimentos sólidos: 13,2 horas x 3,0 horas 

    • Tempo mediano de jejum de líquidos claros: 7,0 horas x 2,4 horas

    Resultados

    • A não realização do jejum, além de ser não-inferior à realização do jejum, demonstrou-se superior para o desfecho primário composto.

     

     

    • O desfecho composto primário ocorreu em 19,1% dos pacientes que fizeram jejum e 12,0% dos pacientes que não fizeram jejum. A diferença absoluta nas proporções foi de −5,2% (IC 95% −9,6 a −0,9; com probabilidade a posteriori maior que 99,5% para não-inferioridade e de 99,1% para superioridade), favorecendo a ausência de jejum.

    • Quando analisados separadamente, os componentes do desfecho primário que tiveram maior participação na diferença entre os grupos foram hipotensão e hiperglicemia. Não houveram episódios de pneumonia aspirativa relacionado ao jejum ou à ausência de jejum.

    • No grupo dos pacientes que não fizeram jejum, os índices de satisfação do paciente foram melhores com uma diferença média de 4,02 pontos (IC 95% 3,36–4,67, fator Bayes >100). 

    • Eventos de desfechos secundários foram observados serem semelhantes.

    Conclusões

    • Eliminar a exigência de jejum antes de procedimentos realizados na sala de hemodinâmica que requerem sedação leve foi seguro e superior ao jejum quando avaliado o desfecho composto de hipoglicemia, hiperglicemia, hipotensão e pneumonia aspirativa.

    Ponto a Ponto

    Pontos Fortes

    • Estudo com uma pergunta pertinente à prática clínica.

    • Desenho robusto, randomizado, de não-inferioridade, com planejamento a priori de análise de superioridade.

    Pontos Fracos

    • 8,9% dos pacientes no grupo sem jejum estavam, de fato, em jejum.

    • Desfecho primário composto com componentes de relevância clínica heterogênea. Nenhum grupo apresentou pneumonia aspirativa, o componente de maior relevância clínica do desfecho. 

    • Episódios de vômitos não foram documentados.

    • Metodologia com estudo aberto. Os participantes do estudo e os profissionais de saúde não foram cegados quanto à alocação dos grupos, o que pode ter  gerado viés de desempenho, além de poder ter impactado desfechos subjetivos como as pontuações de satisfação reportadas pelos pacientes.

    • Procedimentos com dispositivos corresponderam a 15,8% da população total, o que pode restringir a generalização dos resultados para essa coorte.


    Autor do conteúdo

    Mariane Shinzato


    Referências

    Públicação Oficial

    https://app.doctodoc.com.br/conteudos/jejum-versus-ausencia-de-jejum-antes-de-procedimentos-na-sala-de-hemodinamica


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