Ferro Intravenoso em Pacientes sob Hemodiálise de Manutenção
14 de maio de 2024
7 minutos de leitura
Em pacientes sob hemodiálise crônica um regime de altas doses de ferro intravenoso é não inferior a um regime de baixas doses?
Pacientes sob hemodiálise de manutenção geralmente possuem um balanço de ferro negativo devido à absorção reduzida e perda sanguínea elevada. Por isso, a administração de ferro intravenoso tornou-se um tratamento padrão no manejo da anemia e grandes doses são amplamente usadas para reduzir a exposição a agentes estimulantes da eritropoiese, reduzir custos e mitigar preocupações acerca de riscos potenciais, particularmente por conta dos efeitos de toxicidade cardiovascular que foram observados em ensaios clínicos. No entanto, a terapia com ferro intravenoso pode ser prejudicial, aumentando os riscos de infecção, estresse oxidativo, calcificação vascular e aterotrombose. A avaliação científica rigorosa do uso de altas doses de ferro em pacientes sob hemodiálise têm sido limitada, o que resultou em variação acentuada da sua utilização entre os profissionais e entre países. Dessa forma, o estudo PIVOTAL foi realizado para avaliar a não-inferioridade, segurança e eficácia de um regime de altas doses de ferro intravenoso administrado preventivamente quando comparado com um regime de baixas doses de ferro em pacientes sob hemodiálise
Ensaio clínico randomizado de não inferioridade
Multicêntrico (50 centros no Reino Unido)
Aberto
Randomização na proporção de 1:1 com estratificação de acordo com o tipo de acesso para diálise, diagnóstico de DM e tempo de necessidade de diálise
Foi estimado que uma amostra de 2080 pacientes que apresentassem 631 eventos do desfecho primário poderia promover ao estudo um poder de 80% para avaliar a não-inferioridade da alta dose de ferro em relação à baixa dose de ferro, com um limite de não-inferioridade para a hazard ratio de 1,25
Tempo médio de follow-up foi de 2,1 anos, com o máximo de follow-up de 4,4 anos
Pacientes com doença renal crônica e necessidade de hemodiálise incluídos entre 2013 e 2018
Idade ≥ 18 anos
Pacientes submetidos à hemodiálise crônica por doença renal terminal
Estabilidade clínica
Ferritina < 40mcg/ml
Saturação de transferrina < 30%
Em uso de terapia com agentes estimulantes da eritropoiese
Expectativa de vida < 12 meses
Transplante de doador vivo programado para os próximos 12 meses
Programação de troca de tratamento para diálise peritoneal ou hemodiálise domiciliar
Infecção ativa
PCR > 50mg/ml
Malignidade atual ativa
HIV conhecido ou hepatite B ou C ativas
Doença hepática crônica e/ou TGO ou TGP realizados na seleção acima de 3x LSN
Insuficiência cardíaca avançada (NYHA IV)
Gravidez ou amamentação
História de sobrecarga de ferro adquirida
Hipersensibilidade grave ao ferro sucrose intravenoso
Ferro intravenoso em altas doses, em um total de 400mg de ferro sucrose por mês
Administrado profilaticamente
Ferro intravenoso em baixas doses, administrado apenas reativamente
A concentração de ferritina e a saturação de transferrina eram medidas mensalmente e esses valores determinavam a dose mensal de ferro sucrose a ser administrada de forma intravenosa durante a semana subsequente de hemodiálise
No grupo do regime de altas doses intravenosas de ferro, 400mg de ferro sucrose eram administradas por mês, com limites de corte de segurança, acima dos quais a administração de ferro intravenoso adicional era adiada
No grupo de regime de baixas doses intravenosas de ferro, os pacientes recebiam uma dose mensal de 0 a 400mg de ferro sucrose, como requerido para manter uma meta mínima de concentração de ferritina de 200mcg/L e uma saturação de transferrina de 20%
A terapia com ferro era suspensa temporariamente se a equipe do estudo identificasse uma infecção ativa, de acordo com o investigador
Primário: desfecho composto de infarto agudo do miocárdio não fatal, acidente vascular encefálico não fatal, hospitalização por insuficiência cardíaca ou morte por qualquer causa
Secundários: cada componente do desfecho primário isoladamente, morte por qualquer causa, composição de IAM fatal ou não fatal, AVC fatal ou não fatal, hospitalização por insuficiência cardíaca, dose do agente estimulante da eritropoiese, incidência de transfusões sanguíneas e duas medidas de qualidade de vida (European Quality of Life-5 Dimensions [EQ-5D] questionnaire e o Kidney Disease Quality of Life).
Desfechos de segurança: trombose de acesso vascular, hospitalização por qualquer causa, hospitalização por infecção e a taxa de episódios de infecção
MasculinoFeminino
Alta dose (N=1093) x Baixa dose (N=1048):
Idade (anos): 62,7± 14,9 x 62,9± 15,1
Brancos: 79.4% x 79,2%
Negros: 8,5% x 9,3%
Asiáticos: 8,8% x 8,5%
Duração média do tratamento dialítico (meses): 4,9 (2,8 – 8,4) x 4,8 (2,8 – 8,1)
Acesso vascular
Cateter de diálise: 41,1% x 40,8%
Fístula arteriovenosa ou enxerto: 58,9 x 59,2%
Fibrilação atrial: 8,8% x 6,5%
Insuficiência cardíaca: 3,8% x 4,3%
Hipertensão: 73,6% x 71,9%
Dislipidemia: 25,3% x 24,6%
Doença vascular periférica: 8,4% x 9,1%
Infarto agudo do miocárdio prévio: 8,9% x 8,3%
Acidente vascular encefálico prévio: 7,8% x 8,7%
Diabetes: 45,2% x 43,5%
Tabagismo
Fumante: 13,3% x 9,9%
Tabagismo prévio: 23,9% x 27,1%
Nunca fumou: 62,9% x 63%
IMC: 28,5±7,1 x 29±6,7
Pressão arterial (mmHg)
Sistólica: 145±24 x 145±24
Diastólica: 74±14 x 74±15
Hemoglobina (g/dl): 10,6±1,4 x 10,5±1,4
Média de concentração de ferritina sérica (mcg/L): 214 (132 – 305) x 217 (137 – 301)
Média da saturação de transferrina (%): 20 (16-24) x 20 (16-24)
Média de dose de agente estimulante da eritropoiese (IU/semana): 8000 (5000 – 10.000) x 8000 (5000 – 12.000)
O desfecho composto primário foi menos comum no grupo dose alta de ferro do que no grupo dose baixa
Um evento do desfecho primário ocorreu em 29,3% dos pacientes no grupo dose alta versus 32,3% no grupo dose baixa (hazard ratio 0,85; IC95%, 0,73 – 1,0; p< 0,001 para não inferioridade; p=0,04 para superioridade)
A dose cumulativa de agentes estimulantes da eritropoiese foi menor no grupo dose alta do que no grupo dose baixa
A dose média mensal de agentes estimulantes da eritropoiese foi 19,4% menor no grupo dose alta (29.757 IU/mês – intervalo interquartil 18.673 – 48.833) do que no grupo controle (38.805 IU/mês – intervalo interquartil 24377 – 60.620) (diferença média -7539 IU/mês; IC95% , -9485 a – 5582)
A mortalidade foi de 22,5% no grupo dose alta e 25,7% no grupo dose baixa (hazard ratio, 0,84; IC95%; 0.71 – 1.0)
A taxa do desfecho composto de infarto agudo do miocárdio fatal ou não fatal, acidente vascular encefálico fatal ou não fatal, hospitalização por insuficiência cardíaca foi menor no grupo dose alta do que no grupo dose baixa (hazard ratio 0,80; IC95%, 0,64 – 1,0)
Morte e uma composição de infarto agudo do miocárdio, acidente vascular encefálico ou hospitalização por insuficiência cardíaca como eventos recorrentes ocorreu em uma taxa de 19,4 eventos por 100 pacientes-ano no grupo dose alta e 24,6 eventos por 100 pacientes-ano no grupo controle (rate ratio 0,77; IC95%, 0,66 – 0,92)
Pacientes no grupo dose alta apresentavam menor propensão de receber transfusões sanguíneas, quando comparados aos pacientes no grupo dose baixa (hazard ratio 0.79; 95% IC, 0.65 – 0,95).
Não ocorreram diferenças significativas entre os grupos em relação a mudanças, desde a visita inicial, nas duas medidas de qualidade de vida (European Quality of Life-5 Dimensions [EQ-5D] questionnaire e o Kidney Disease Quality of Life).
A trombose de acesso vascular ocorreu em 24% dos pacientes no grupo dose alta e em 20,8% nos pacientes do grupo dose baixa. (p=0,12)
As taxas de hospitalização por qualquer causa e por infecção foi similar nos dois grupos
Entre pacientes sob hemodiálise de manutenção, o uso de um regime de altas doses de administração de ferro intravenoso preventivamente resultou numa redução significativa no risco de morte ou eventos cardiovasculares maiores não-fatais, quando comparado com um regime de baixas doses, administradas de forma reativa.
Estudou o impacto de uma intervenção simples sobre os desfechos clínicos de uma população de alto risco e pouco estudada (pacientes com doença renal crônica terminal). Dessa forma, apresenta grande relevância para nossa prática clínica.
Boa proporção de distribuição de comorbidades entre os grupos.
Tempo prolongado de follow up (média de 2,1 anos), o que possibilitou que o impacto da intervenção fosse avaliado de maneira mais acurada
Estudo aberto
Baixa proporção de pacientes negros. Dessa forma, houve pouca heterogeneidade étnica.
Baixa proporção de pacientes do sexo feminino
Utilizou um desfecho composto como seu desfecho primário. Dessa maneira, há menor confiabilidade dos achados do estudo, visto que não foram avaliados individualmente
Autor do conteúdo
Carolina Ferrari
Referências
Públicação Oficial
https://app.doctodoc.com.br/conteudos/ferro-intravenoso-em-pacientes-sob-hemodialise-de-manutencao
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