Exclusão de Síndrome Coronariana Aguda Sem Supra de ST por uma Medida Única e Pré-Hospitalar de Troponina
16 de maio de 2024
8 minutos de leitura
Qual o impacto sobre os custos em saúde da exclusão pré-hospitalar de síndrome coronariana aguda sem supra de ST com uma medida única de troponina?
De todas as visitas ao departamento de Emergência, cerca de 10% consistem em pacientes com dor torácica e suspeita de síndrome coronariana aguda sem supra de ST (SCASST). Ao mesmo tempo, 80 a 90% desses pacientes não possuem SCASST, no momento de seu atendimento e, especialmente em pacientes de baixo risco, a SCASST raramente é encontrada. Além disso, visitas ao departamento de emergência por dor torácica frequentemente incluem testes adicionais dispendiosos e permanência intra-hospitalar prolongada que não beneficiam os pacientes de baixo risco. Portanto, o manejo atual de dor torácica no departamento de emergência contribui para sua superlotação e mais custos. A estratificação de risco pré-hospitalar de pacientes com dor torácica tem mostrado serventia em ajudar a reduzir a superlotação dos departamentos de emergência e os custos. O HEART escore é uma ferramenta simples e bem validada para estratificação de risco de pacientes com dor torácica no setor de emergência, com uma confiabilidade geral muito forte, independente do nível de educação do profissional de saúde. Com uma medida de troponina realizada no local do atendimento inicial incorporada ao HEART escore, os paramédicos da ambulância podem identificar adequadamente os pacientes de baixo risco em avaliação pré-hospitalar. No entanto, a exclusão de síndrome coronariana aguda sem supra de ST no cenário pré-hospitalar não foi investigada em estudo randomizado e seu impacto nos custos em saúde não são conhecidos. Dessa forma, foi realizado o estudo ARTICA, com o objetivo de avaliar os custos de saúde em 30 dias e a incidência de eventos cardíacos adversos maiores de uma estratégia de exclusão pré-hospitalar para pacientes com suspeita de SCASST.
Ensaio clínico randomizado
Multicêntrico (5 regiões de ambulância na Holanda)
Aberto
Randomização na proporção de 1:1 em blocos de tamanhos variados
Uma amostra de 392 participantes por grupo era estimada para alcançar um poder de 80% de detectar uma diferença de custo no atendimento de 507 euros entre os grupos, com um alfa de 0,05, usando um teste-t de duas amostras.
Pacientes de baixo risco com dor torácica e suspeita de síndrome coronariana aguda sem supra de ST incluídos entre 2019 e 2022
Idade ≥ 18 anos
Suspeita de síndrome coronariana aguda sem supra de ST
Duração dos sintomas de pelo menos 2 horas
HEAR(T) escore modificado ≤ 3
Assinatura do termo de consentimento informado
Elevação do segmento ST
Suspeita de causa não cardíaca para os sintomas, necessitando de visita ao departamento de emergência
Escala de Coma de Glasgow < 8
Déficit cognitivo conhecido
Gravidez
Choque cardiogênico
PA sistólica < 90 mmHg, FC > 100 bpm e SO2 < 90%
Síncope
Sinais de insuficiência cardíaca
Desordens de ritmo cardíaco e BAV de segundo ou terceiro grau
Doença renal terminal conhecida
Suspeita de dissecção de aorta ou tromboembolismo pulmonar
IAM confirmado, angioplastia ou cirurgia de revascularização miocárdica < 30 dias
Dificuldade de comunicação e/ou barreiras de linguagem com o paciente
Decisão médica de avaliar o paciente no departamento de emergência
Qualquer condição médica ou mental significativa que, na opinião do investigador, possa interferir na participação ótima do paciente no estudo.
Estratégia de exclusão pré-hospitalar
Medida de troponina rápida no local de atendimento inicial
Estratégia de exclusão no departamento de emergência
Transferência imediata para o departamento de emergência
Outros tratamentos e definições:
A avaliação inicial era realizada pelos paramédicos das ambulâncias que eram treinados como sub-investigadores do estudo, para que tivessem capacidade para incluir pacientes no ensaio clínico
O HEAR escore inclui os componentes: história clínica, eletrocardiograma, idade e fatores de risco do já conhecido HEART escore
Se o paciente apresentasse HEAR(T) escore modificado ≤ 3, preenchesse os critérios de inclusão e não estivesse nos critérios de exclusão, era selecionado para o estudo e randomizado em um dos grupos. No grupo intervenção, os pacientes realizavam uma medida de troponina rápida no momento da avaliação inicial, pelos paramédicos; se o valor da troponina fosse baixo (<40 ng/L), o cuidado do paciente era transferido para seu clínico geral; se o valor da troponina fosse elevado (≥40 ng/L), o paciente era mandatoriamente transportado para o departamento de emergência. No grupo controle, os pacientes eram transferidos diretamente para o departamento de emergência para avaliação, sem a realização de troponina rápida e avaliados de acordo com as práticas de cuidado padrão
Em todos os pacientes, no começo do atendimento, um eletrocardiograma de 12 derivações era realizado e avaliado pela equipe de paramédicos. Caso houvesse alguma dúvida sobre o traçado do eletrocardiograma, o exame poderia ser transmitido, para avaliação imediata, para um cardiologista independente
Follow-up era realizado para todos os pacientes após 30 dias da avaliação inicial por contato telefônico ou e-mail. Se, nesse período, o paciente tivesse ido à algum hospital, este hospital era contactado a fim de coletar todas as informações sobre procedimentos e eventos clínicos
Primário: custos, do ponto de vista de cuidados em saúde, em 30 dias
Secundários: eventos adversos cardiovasculares maiores (MACE) em 30 dias, o que era definido como um ou mais dos seguintes eventos: síndrome coronariana aguda, revascularização não planejada e mortalidade por todas as causas; custos do ponto de vista social (definido como soma dos custos de saúde e dos custos de perda de produtividade)
MasculinoFeminino
Exclusão pré-hospitalar (N=434) x Departamento emergência (N=429)
Idade (anos): 53,7 (13,1) x 53,2 (12,5)
HEAR escore (médio): 3 (2-3) x 3 (2-3)
Componente história clínica (HEAR) – médio: 0 (0-1) x 1 (0-1)
Componente eletrocardiograma (HEAR) – médio: 0 (0-0) x 0 (0-0)
História de doença aterosclerótica (%): 7,8% x 5,4%
Hipertensão: 19,6% x 16,6%
Diabetes Mellitus: 5,1% x 3,3%
Tabagismo ativo: 25,8% x 25,6%
Hipercolesterolemia: 8,5% x 8,2%
História familiar: 35,7% x 35,4%
IMC ≥ 30kg/m²: 19,8% x 18,6%
Início dos sintomas > 24h: 30% x 28,7%
Início dos sintomas < 24h: 70% x 71,3%
Início (horas) dos sintomas (se menor que 24h) – médio: 7,1 (5,2) x 6,8 (5,3)
Troponina elevada: 4,1% x 5,6%
Os custos, do ponto de vista de cuidados em saúde, em 30 dias foram significativamente menores no grupo intervenção (1349 euros ±2051 euros versus 1960 euros ±1808 euros), com uma diferença média de 611 euros ( IC95% - 353 euros a 869 euros, p<0.001).
Essa diferença foi conduzida principalmente pelos custos das visitas ao departamento de emergência e seus testes diagnósticos associados (eletrocardiograma, exames laboratoriais, mensurações adicionais de troponina e radiografias de tórax)
No grupo intervenção, MACE em 30 dias ocorreu em 0,5% dos pacientes e no grupo controle ocorreu em 1% dos pacientes, com uma estimativa pontual para a diferença de risco de -0.5% (95% IC; - 1.6 a 0,7%, p=0,41)
No grupo intervenção, 0,5% dos pacientes apresentaram síndrome coronariana aguda, 0,5% dos pacientes receberam revascularização não planejada e nenhum paciente morreu após a estratégia de exclusão de síndrome coronariana aguda, no cenário extra-hospitalar.
No grupo controle, 0,7% dos pacientes apresentaram síndrome coronariana aguda, 0,7% dos pacientes receberam revascularização não planejada e 1 paciente morreu após estratégia de exclusão de síndrome coronariana aguda, no cenário de departamento de emergência.
Os custos relacionados à perda de produtividade não mostraram diferenças significativas entre os grupos (785 euros ±1646 euros versus 893 euros ±1757 euros), com uma diferença média de 108 euros (95% IC – 128 euros a 344 euros, p=0.37).
Os custos do ponto de vista social foram significativamente menores no grupo intervenção (2157 euros ± 2900 euros versus 2842 euros ± 2819 euros), com uma diferença média de 685 euros (95% IC; 289 euros a 1081 euros , p=0.001)
A exclusão pré-hospitalar de síndrome coronariana aguda sem supra de ST, em pacientes de baixo risco com o uso de um teste com troponina rápida no local do atendimento inicial combinado à realização de um escore de risco clínico, leva a maior redução de custos em saúde e é associado a muito baixa ocorrência de eventos cardiovasculares adversos maiores
Avaliou o impacto de uma intervenção clínica mais barata, de fácil utilização e clinicamente validada (troponina rápida + aplicação do HEAR(T) escore) sobre os custos em saúde, o que tem grande relevância em nossa prática clínica.
Utilizou uma ferramenta validada, objetiva e segura para definir o risco cardiovascular dos pacientes (HEAR(T) escore)
Realizou treinamento adequado das equipes assistenciais das ambulâncias. Dessa maneira não houve dúvida e consequente retardo na aplicação da intervenção ou da transferência para unidade de emergência. Tal agilidade é fundamental para o tratamento ótimo do paciente
Boa proporção de distribuição de comorbidades entre os grupos. Dessa forma, não houve viés de seleção
Boa proporção entre pacientes do sexo masculino e feminino
Estudo aberto
Avaliou apenas pacientes da Holanda, o que impede generalização de seus resultados
Avaliou apenas pacientes com tempo de dor de, pelo menos, 2 horas. Dessa forma, seus resultados não podem ser aplicados para pacientes com dor torácica com tempo menor de dor e que pudessem ter um quadro de SCA em curso
Descreve pouco os motivos que levaram à exclusão de pacientes por indicação médica de levar ao departamento de emergência. Seria interessante entender quais pontos excluíram pacientes para evitar viés de seleção
Autor do conteúdo
Carolina Ferrari
Referências
Públicação Oficial
https://app.doctodoc.com.br/conteudos/exclusao-de-sindrome-coronariana-aguda-sem-supra-de-st-por-uma-medida-unica-e-pre-hospitalar-de-troponina
Compartilhe
Copyright © 2024 Portal de Conteúdos MEDCode. Todos os direitos reservados.