Ensaio Randomizado sobre Aborto Medicamentoso Muito Precoce
28 de janeiro de 2025
5 minutos de leitura
Qual é a eficácia e segurança do aborto medicamentoso iniciado em gestações muito precoces em comparação ao tratamento padrão?
O aborto medicamentoso com mifepristona e misoprostol é uma abordagem eficaz e segura para interrupção da gravidez no primeiro trimestre. Contudo, há poucas evidências sobre sua eficácia em estágios muito precoces, antes que a gravidez possa ser visualizada por ultrassom. Muitos protocolos clínicos recomendam esperar pela confirmação ultrassonográfica para evitar complicações, como gravidez ectópica. Este estudo visa avaliar a eficácia e segurança do início imediato do aborto medicamentoso (grupo "Precoce") em comparação ao tratamento padronizado com confirmação ultrassonográfica (grupo "Padrão") em mulheres com gestações de até 42 dias.
Ensaio clínico randomizado de não inferioridade.
Multicêntrico: 26 centros em 9 países (Suécia, Escócia, Áustria, Finlândia, Nepal, Austrália, Noruega, Nova Zelândia e Dinamarca).
Aberto, devido à natureza da intervenção.
Randomização na proporção de 1:1 com estratificação por centros.
1360 participantes seriam necessárias para detectar a não inferioridade com poder de 90%, assumindo uma eficácia de 97% para ambos os grupos e uma margem de não inferioridade de 3%.
Mulheres solicitando aborto medicamentoso em gestações de até 42 dias recrutadas entre 2019 e 2023.
Idade ≥18 anos.
Idioma: fala inglês ou língua local.
Gestação de até 42 dias com localização não confirmada por ultrassom.
Sintomas de gravidez patológica (ex.: dor abdominal unilateral).
Fatores de risco para gravidez ectópica (ex.: dispositivo intrauterino).
Contraindicações ao aborto medicamentoso (ex.: alergia a mifepristona ou misoprostol).
Gravidez ectópica ou molar.
Grupo Precoce
Início imediato de aborto medicamentoso
Grupo Padrão
Tratamento iniciado após confirmação de gravidez intrauterina por ultrassom em 7 ou 14 dias.
Todas as pacientes recebiam a terapia recomendada pela Organização Mundial da Saúde
200 mg de mifepristona oral e 800 µg de misoprostol (vaginal, sublingual ou oral) após 24-48h.
Dose adicional de 400 µg de misoprostol, se necessário.
As participantes receberam analgesia oral conforme protocolo local
Primário: completação do aborto sem necessidade de intervenção cirúrgica.
Secundários: gravidez em curso; complicações (ex.: infecções, hemorragias); necessidade de intervenção cirúrgica adicional; satisfação e preferência das participantes.
MasculinoFeminino
Precoce (N=7 41) x Padrão (N=724)
Idade média (anos): 29,6 x 29,7
IMC médio (kg/m²): 24,9 x 24,9
Número de gestação, incluindo a atual (%):
1: 22,5 x 24,7
2: 17,8 x 16,0
≥3: 59,6 x 59,3
Nuliparidade (%): 34,3 x 34,1
Aborto prévio (%): 19,0 x 20,0
Gestação ectópica prévia (%): 0,3 x 0,4
Último período menstrual (%):
Certo: 87,7 x 87,6
Incerto: 12,3 x 12,4
Duração mediana da gestação (dias): 37 x 36
Achados da ultrassonografia (%):
Gravidez de localização desconhecida: 32,5 x 36,1
Gravidez intrauterina provável: 67,5 x 63,9
Nível sérico de hCG (mediana): 2220 x 1850
Gravidez patológica (%):
Perda precoce da gravidez: 1,2 x 13,3
Gravidez molar: 0,1 x 0,1
Gravidez de localização desconhecida: 0,1 x 0,1
Gravidez ectópica: 1,3 x 0,8
O início precoce de tratamento medicamentoso foi não inferior ao tratamento padrão
Os grupos Precoce e Padrão apresentaram diferença de -0,1% (IC95%, -2,4 a 2,1) na completação do aborto.
Precoce: 95,2% completaram o aborto.
Padrão: 95,3% completaram o aborto.
O grupo Precoce apresentou 3,0% de gravidez em curso vs. 0,1% no grupo Padrão (IC95%: -3,2 a -2,8; P < 0,001).
A necessidade de intervenções cirúrgicas para aborto incompleto ocorreu em 1,8% das participantes do grupo Precoce, comparado a 4,5% no grupo Padrão (IC95%: -3,9 a -1,7; p=0,002).
Infecções tratadas com antibióticos foram reportadas em 1,7% no grupo Precoce e 4,6% no grupo Padrão (IC95%: -3,5 a -1,5; P = 0,001).
A satisfação das pacientes foi significativamente maior no grupo Precoce (92,8%) em relação ao grupo Padrão (85,6%; IC95%: 4,1 a 10,3; P < 0,001).
O aborto medicamentoso iniciado antes da confirmação ultrassonográfica de gravidez intrauterina é não inferior ao tratamento padronizado em termos de eficácia, sendo uma opção viável e segura.
Design multicêntrico e internacional, garantindo robustez e validade externa ao estudo.
Estudo dimensionado adequadamente para testar suas hipóteses principais. Amostra ampla e análise robusta.
O estudo aborda uma lacuna clínica importante, oferecendo evidências para a aplicação de um protocolo menos restritivo em relação à ultrassonografia, relevante em cenários com barreiras ao acesso ao aborto.
A ausência de cegamento, apesar de inviável, pode introduzir vieses, especialmente em desfechos relatados pelas pacientes, como satisfação ( desfechos não duros)
A heterogeneidade entre os centros participantes pode afetar a consistência dos resultados, considerando diferentes práticas clínicas locais.
O estudo não incluiu um acompanhamento de longo prazo, limitando a avaliação de complicações tardias.
A margem de não inferioridade definida (3%) pode ser considerada ampla por alguns especialistas, reduzindo a rigorosidade na interpretação dos resultados.
Autor do conteúdo
Beatriz Vilaça
Referências
Públicação Oficial
https://app.doctodoc.com.br/conteudos/ensaio-randomizado-sobre-aborto-medicamentoso-muito-precoce
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