Ensaio Clínico da Cladribina Oral para Esclerose Múltipla Recorrente.
25 de fevereiro de 2025
7 minutos de leitura
A cladribina, quando comparada ao placebo, reduz a taxa anual de surtos em pacientes com Esclerose Múltipla Remitente-Recorrente?
A esclerose múltipla é uma doença autoimune crônica e debilitante do sistema nervoso central, no qual as células T e B desempenham um papel central na fisiopatologia. As terapias imunossupressoras parenterais atualmente aprovadas oferecem benefícios no tratamento e prognóstico da doença. No entanto, essas opções têm eficácia limitada em alguns pacientes, além de preocupações com segurança e efeitos colaterais. Além disso, a necessidade de administração parenteral pode dificultar a adesão ao tratamento. A cladribina atua acumulando um metabólito ativo que interrompe o metabolismo celular, inibe a síntese e reparo do DNA e induz apoptose, afetando preferencialmente os linfócitos. Isso leva a reduções sustentadas nas células CD4+ e CD8+ e efeitos mais transitórios nas células B CD19+, além da diminuição de citocinas inflamatórias e moléculas de adesão. Além disso, por ter apresentação via oral, pode facilitar adesão medicamentosa. Portanto, o estudo CLARITY se propôs a avaliar a eficácia e segurança da cladribina em pacientes com esclerose múltipla recorrente.
Ensaio clínico randomizado
Multicêntrico (155 centros em 32 países)
Duplo cego
Controlado por placebo
Randomização 1:1:1 (Cladribina 3,5 mg/kg, Cladribina 5,25 mg/kg ou placebo) e estratificação baseada em sistema computacional)
Cálculo de 1290 participantes totais para um poder estatístico de 90% em detectar uma redução relativa clinicamente significativa de 25% na taxa de surtos. Esse cálculo foi realizado com um teste t bicaudal. A taxa de erro tipo I (bicaudal) para a comparação foi 2,5%.
Adultos com diagnóstico de EMRR recrutados entre 2005 e 2007
Diagnóstico de esclerose múltipla recorrente-remitente (EMRR), de acordo com os critérios de McDonald.
Presença de lesões compatíveis com esclerose múltipla na ressonância magnética (RM), segundo os critérios de Fazekas.
Pelo menos um surto nos últimos 12 meses.
Escore de até 5,5 na Escala Expandida de Estado de Incapacidade de Kurtzke (EDSS).
Falha de duas ou mais terapias modificadoras de doença.
Uso prévio de terapia imunossupressora.
Necessidade de um período de washout de pelo menos 3 meses para qualquer droga modificadora da doença previamente utilizada.
Uso de terapia baseada em citocinas, IVIG ou plasmaférese nos últimos 3 meses.
Alterações em testes hematológicos (plaquetas ou neutrófilos abaixo do limite inferior da normalidade, ou leucócitos abaixo da metade do limite inferior da normalidade) 28 dias antes do início do estudo.
Presença de doença sistêmica ou infecção que comprometa a função imunológica (incluindo HIV ou vírus linfotrópico de células T humanas).
Surto nos últimos 28 dias.
Cladribina oral em doses cumulativas diferentes de 3,5 mg/kg ou 5,25 mg/kg, administrada em ciclos curtos por 96 semanas.
Primeiro período (0 a 48 semanas): os pacientes receberam dois cursos de cladribina seguidos de dois cursos de placebo (grupo de 3,5 mg) ou quatro cursos de cladribina (grupo de 5,25 mg).
Segundo período (48 a 96 semanas): os grupos de cladribina receberam dois cursos adicionais da medicação.
Placebo oral com o mesmo esquema de administração.
Cada ciclo durava de 4 a 5 dias dentro de um período de 28 dias.
Os pacientes tomavam 1 ou 2 comprimidos de 10 mg por dia, dependendo do peso corporal.
O total de dias de tratamento por ano variou entre 8 e 20 dias, distribuídos entre os dois períodos de 48 semanas.
Primário: taxa de surtos anual em 96 semanas.
A definição de surto utilizada no estudo foi um aumento de 2 pontos em pelo menos um sistema funcional da EDSS ou um aumento de 1 ponto em pelo menos dois sistemas funcionais da EDSS, excluindo alterações na função intestinal, vesical ou cognição. O surto deveria ocorrer na ausência de febre, ter duração mínima de 24 horas e ser precedido por um período de pelo menos 30 dias de estabilidade ou melhora clínica.
Secundários: proporção de pacientes livres de surtos, o tempo até a progressão sustentada da incapacidade (≥1 ponto na EDSS por ≥3 meses ou ≥1,5 pontos se EDSS basal = 0); tempo até o primeiro surto e a necessidade de terapia de resgate com interferon beta-1a; média de lesões por exame, incluindo T1 com realce por gadolínio, T2 ativas e lesões únicas combinadas; incidência de eventos adversos emergentes e análises laboratoriais.
MasculinoFeminino
PBO (N=437) × CLAD 3,5 mg/kg (N=433) × CLAD 5,25 mg/kg (N=456):
Idade (anos) média: 38,7 / 37,9 / 39,1
Idade (anos) faixa: 18–64 / 18–65 / 18–65
Sexo feminino (%): 65,9 / 68,8 / 68,4
Peso médio (kg): 70,3 / 68,1 / 69,3
Raça branca (%): 98,2 / 98,2 / 97,8
Raça negra (%): 0,2 / 0,5 / 0,9
Outras raças (%): 1,6 / 1,4 / 6
Terapia prévia com qualquer medicamento modificador da doença (%): 32,5 / 26,1 / 32,3
Duração média da doença (anos): 8,9 / 7,9 / 9,3
Faixa de duração da doença desde o primeiro sintoma (anos): 0,4–39,5 / 0,3–42,3 / 0,4–35,2
Pontuação média na EDSS:
0 %: 3,0 / 2,8 / 2,4
1 %: 16,0 / 17,3 / 17,5
2 %: 29,1 / 30,7 / 26,1
3 %: 22,0 / 24,9 / 23,7
4 %: 19,0 / 16,4 / 18,4
>=5 %: 11,0 / 7,9 / 11,8
Pontuação média na EDSS: 2,9 / 2,8 / 3,0
Lesões T1 com realce por gadolínio:
Pacientes com lesões (%): 29,3 / 31,9 / 32,2
Média do número de lesões: 0,8 / 1,0 / 1,0
Volume médio de lesões em T2 (mm³): 14.287,6 / 14.828,0 / 17.202,1
Houve uma redução significativa nas taxas de surtos nos grupos de Cladribina (0,14 no grupo de 3,5 mg/kg e 0,15 no grupo de 5,25 mg/kg), comparado ao placebo (0,33). As reduções relativas foram de 57,6% e 54,5%, respectivamente (P<0,001 para ambos).
A maior proporção de pacientes sem surtos foi observada nos grupos Cladribina (79,7% no grupo de 3,5 mg/kg e 78,9% no grupo de 5,25 mg/kg), em comparação com o placebo (60,9%) (P<0,001 para ambos).
O tempo até o primeiro surto foi significativamente maior nos grupos Cladribina, indicando um efeito prolongado na redução da atividade da doença (HR 0,44 para 3,5 mg/kg e 0,46 para 5,25 mg/kg, ambos P<0,001).
Houve uma redução significativa na necessidade de terapia de resgate com interferon beta-1a nos grupos Cladribina em comparação com placebo (60% no grupo de 3,5 mg/kg e 69% no grupo de 5,25 mg/kg; P=0,01 e P=0,003, respectivamente).
O risco de progressão sustentada da incapacidade foi significativamente menor nos grupos Cladribina, com uma redução de 33% no grupo de 3,5 mg/kg (HR 0,67; IC 95%, 0,48–0,93; P=0,02) e 31% no grupo de 5,25 mg/kg (HR 0,69; IC 95%, 0,49–0,96; P=0,03).
Houve uma redução significativa na atividade inflamatória da doença nos grupos Cladribina em comparação com o placebo, com menor número médio de lesões T1 realçadas por gadolínio (0,12 e 0,11 vs. 0,91), lesões T2 ativas (0,38 e 0,33 vs. 1,43) e lesões únicas combinadas (0,43 e 0,38 vs. 1,72) (P<0,001 para todos os desfechos).
Linfopenia foi o evento adverso mais comum, ocorrendo com maior frequência nos grupos Cladribina (21,6% no grupo de 3,5 mg/kg e 31,5% no grupo de 5,25 mg/kg vs. 1,8% no placebo), geralmente de intensidade leve a moderada.
Herpes zoster ocorreu em 20 pacientes tratados com Cladribina (8 no grupo de 3,5 mg/kg e 12 no grupo de 5,25 mg/kg), sem complicações graves.
Infecções foram mais frequentes nos grupos Cladribina, sendo a maioria leves ou moderadas.
Neoplasias ocorreram em 1,4% dos pacientes no grupo de 3,5 mg/kg, 0,9% no grupo de 5,25 mg/kg e nenhum no placebo
Houve seis mortes sem padrão claro de relação com o tratamento. Um paciente do grupo Cladribina 5,25 mg/kg teve exacerbação de tuberculose latente, evoluindo para parada cardiorrespiratória e óbito
A cladribina, na forma oral, é eficaz na redução das taxas anuais de surtos em pacientes com Esclerose Múltipla Remitente-Recorrente, em comparação com o placebo.
Utilização de desfechos clínicos (taxas de surtos, EDSS) e radiológicos.
Descrição detalhada dos efeitos adversos graves e mortes.
Representatividade ampla de pacientes em diferentes estágios clínicos da doença.
Definição objetiva de surto a partir de escala (EDSS).
Maioria dos participantes brancos com baixa representatividade de outras raças.
Pacientes com falha em dois ou mais tratamentos modificadores da doença foram excluídos, limitando a extrapolação dos achados para casos mais graves ou resistentes.
O estudo usou placebo como controle, sem comparação com tratamentos padrão já estabelecidos, como o natalizumabe, impossibilitando uma avaliação de superioridade.
Autor do conteúdo
Fernando Falcão
Referências
Públicação Oficial
https://app.doctodoc.com.br/conteudos/ensaio-clinico-da-cladribina-oral-para-esclerose-multipla-recorrente
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