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    Efeitos da Hidrocortisona na Evolução para Choque Circulatório em Pacientes com Sepse Grave

    16 de julho de 2024

    5 minutos de leitura

    Pergunta:

    • O uso de hidrocortisona em pacientes com sepse, sem choque, diminui o risco de progressão para choque séptico? 

    Background:

    • A despeito de décadas de pesquisa, o uso de corticoides em dose baixa, em pacientes com sepse, permanece controverso. Atualmente as principais diretrizes sobre o tema recomendam o uso de corticoides em pacientes com choque séptico somente, baseando-se em alguns estudos que demonstraram melhora mais rápida do choque e talvez menor mortalidade nesse cenário. Alguns estudos recentes, incluindo pacientes com pneumonia comunitária grave, sugerem que o uso de hidrocortisona em dose baixa pode aumentar a sobrevida e reduzir a progressão para quadros de choque. Considerando que há um continuum entre sepse grave e choque séptico, seria esperado que o uso de hidrocortisona, em pacientes sem choque, poderia prevenir a piora clínica e progressão para choque séptico. Este estudo foi realizado para testar essa hipótese. 

    Desenho do estudo:

    • Ensaio clínico multicêntrico (34 centros na Alemanha)

    • Randomizado

    • Duplo cego

    • Foi calculado que 169 pacientes, por grupo, seriam necessários para detectar uma diferença absoluta de 15% entre os grupos (considerando que 40% do grupo controle teria o desfecho primário), com 80% de poder e erro alfa de 5%. Considerando uma expectativa de 10% de perdas de seguimento, optou-se pela inclusão de 190 pacientes em cada grupo (amostra total de 380 pacientes)

    População:

    • Pacientes com sepse grave recebendo cuidados em unidades intermediárias ou unidades de terapia intensiva, recrutados entre 2009 e 2013

    Critérios de inclusão:

    • Infecção confirmada ou suspeita

    • Presença de 3 ou mais sinais de inflamação sistêmica:

      • Febre ou hipotermia (Temperatura maior que 38ºC ou menor que 36ºC)

      • Taquicardia (FC > 90 bpm)

      • Taquipneia (FR > 20 rpm ou PaCO2 < 32 mmHg)

      • Leucocitose (> 12 mil) ou leucopenia (< 4 mil) ou mais de 10% de formas imaturas. 

    • Presença de, pelo menos, uma disfunção orgânica

    • Consentimento para inclusão no estudo

    Principais critérios de exclusão:

    • Presença de choque séptico (definido como hipotensão por mais de 4 horas com necessidade de vasopressores, a despeito de reposição volêmica adequada)

    • Idade menor que 18 anos

    • Hipersensibilidade à hidrocortisona ou ao manitol (placebo usado)

    • Indicações específicas para uso ou tratamento prévio com glicocorticoides

    Intervenção:

    • Hidrocortisona, 50 mg endovenoso como dose de ataque, seguida de 200 mg/dia, em infusão contínua por 5 dias, 100 mg/dia nos dias 6 e 7, 50 mg/dia nos dias 8 e 9 e 25 mg/dia nos dias 10 e 11

    Controle:

    • Placebo (manitol) em volume equivalente

    Outros tratamentos:

    • A medicação do estudo era interrompida em caso de eventos adversos, alta da UTI ou ocorrência do desfecho primário

    Desfechos:

    • Desfecho primário: desenvolvimento de choque séptico em 14 dias ou até a alta da UTI

    • Desfechos secundários: tempo até o desenvolvimento de choque séptico ou morte, mortalidade na UTI, no hospital e em 28, 90 e 180 dias, duração da internação em UTI e no hospital, evolução das disfunções orgânicas (avaliada pelo SOFA), tempo de ventilação mecânica e de diálise, frequência de delirium, eventos adversos

    Características dos pacientes:

    • As características dos grupos no momento da randomização foram comparáveis, exceto pelo foco infecciosocom uma maior ocorrência de pneumonia no grupo placebo e uma maior ocorrência de infecção intra-abdominal no grupo hidrocortisona​​​​

    • Foram avaliados 9953 pacientes, sendo que 380 foram randomizados

    • Hidrocortisona (N=190) x Placebo (N=190)

      • Idade: 65,5 x 64,6 anos

      • Sexo masculino: 66,7% x 63,1%

      • SOFA: 6,4 x 6,2

      • APACHE II: 19,5 x 18,5 

      • Infecção comunitária: 46,3% x 47,2%

      • Foco da infecção:

        • Pulmonar: 37,6% x 53,4%

        • Intra-abdominal: 24,8% x 16,4%

        • Urogenital: 16,1% x 14,4%

    Resultados:

    • Em 14 dias, a incidência de choque séptico foi de 21,2% no grupo hidrocortisona e 22,9% no grupo placebo (diferença absoluta de −1,8%; IC 95% −10,7% a 7,2%; P = 0,70)

    • A análise por protocolo, bem como análises de subgrupo, tiveram resultados consistentes com a análise primária

    • Não houve diferença em nenhum desfecho secundário:

      • Hidrocortisona x Placebo

      • Mortalidade em 28 dias: 8,8% x 8,2%

      • Tempo na UTI: 8 x 9 dias

      • Tempo no hospital: 26 x 25 dias

      • Dias livres de VM: 4 x 5 dias

      • Dias livres de HD: 6 x 7 dias

      • SOFA mediano até o dia 14: 4,7 x 5

    • Houve uma incidência maior de hiperglicemia no grupo hidrocortisona (90,9% x 81,5%, P = 0,009). Os demais eventos adversos foram similares entre os grupos

    • A incidência de delirium foi menor no grupo hidrocortisona (8,5% x 19,2%; P = 0,01)

    Conclusões:

    • Em pacientes com sepse grave, o uso de hidrocortisona não reduziu o risco de progressão para choque séptico em 14 dias. 

    Pontos Fortes:

    • Estudo multicêntrico e randomizado. A inclusão de múltiplos centros e a aleatorização fortalecem a validade externa e a generalização dos resultados.

    • Estudo pragmático. O desenho pragmático reflete a prática clínica real, aumentando a aplicabilidade dos achados na rotina clínica.

    • Estudo duplo cego.  O duplo cegamento minimiza vieses de observação e performance, garantindo maior confiabilidade nos resultados.

    Pontos Fracos:

    • Houve um desbalanço entre os grupos com maior ocorrência de pneumonia no grupo placebo. Considerando que há evidência prévia de benefícios do uso de hidrocortisona em pacientes com pneumonia, esse desbalanço pode ter favorecido o grupo placebo e reduzido a diferença entre os grupos.

    • Embora o estudo tenha alcançado o número necessário de pacientes para o poder amostral, os critérios restritivos de inclusão e exclusão resultaram na triagem de muitos pacientes, dos quais a maioria não foi incluída (menos de 5%), por já apresentar choque séptico ou ter indicações para uso de glicocorticoides. Isso pode limitar a aplicabilidade dos resultados a uma população mais ampla.

    • A taxa de desenvolvimento de choque séptico no grupo placebo (23%) foi menor do que a esperada (40%) utilizada para o cálculo do tamanho da amostra. Isso pode ter reduzido a capacidade do estudo de detectar uma diferença significativa​​.


    Autor do conteúdo

    Luis Júnior


    Referências

    Públicação Oficial

    https://app.doctodoc.com.br/conteudos/efeitos-da-hidrocortisona-na-evolucao-para-choque-circulatorio-em-pacientes-com-sepse-grave


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