Como Eu Trato o Hipertireoidismo e a Tireotoxicose
19 de fevereiro de 2025
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Racional
Tireotoxicose é o estado clínico decorrente do excesso da ação de hormônios tireoidianos nos tecidos periféricos. O hipertireoidismo refere-se à tireotoxicose causada pela produção e secreção aumentada de hormônios tireoidianos pela glândula tireoide. O tratamento do hipertireoidismo e da tireotoxicose exige um diagnóstico preciso de sua causa.
A diretriz foi desenvolvida pela ATA (American Thyroid Association) com o propósito de fornecer informações baseadas em evidências para o diagnóstico e manejo de hipertireoidismo e tireotoxicose. Esta diretriz é uma atualização da publicação original de 2011. Neste texto, abordaremos as recomendações mais relevantes para o tratamento do hipertireoidismo causado por bócio multinodular tóxico, adenoma tóxico, o hipertireoidismo subclínico e as diversas etiologias de tireotoxicose.
O método adotado foi o sistema de classificação GRADE (Grading of Recommendations, Assessment, Development and Evaluation Group), que utiliza três graus de recomendação: recomendação forte (benefícios claramente superam os riscos, ou vice-versa), recomendação fraca (benefícios se aproximam dos riscos) e sem recomendação (risco-benefício não pode ser determinado). Além disso, a qualidade das evidências encontradas na literatura foi estratificada em quatro níveis: alto, moderado, baixo e insuficiente.
Recomendações
Etiologia da Tireotoxicose
Se o diagnóstico não for evidente com base na apresentação clínica e nos exames bioquímicos iniciais, solicitar exames diagnósticos, que podem incluir (1) dosagem de TRAb, (2) captação de iodo radioativo, e/ou (3) avaliação da vascularização tireoidiana na ultrassonografia; solicitar cintilografia com I123 ou Tc99m quando o quadro clínico sugerir um adenoma tóxico ou bócio multinodular tóxico. - Recomendação forte, nível de evidência moderado
Prescrever beta-bloqueadores para todos os pacientes com tireotoxicose sintomática, especialmente para idosos, pacientes com frequência cardíaca superior a 90 bpm ou aqueles com doença cardiovascular coexistente. - Recomendação forte, nível de evidência moderado
Bócio Multinodular Tóxico (BMT) e Adenoma Tóxico (AT)
Tratar pacientes com hipertireoidismo por bócio multinodular tóxico ou adenoma tóxico com radioiodoterapia ou tireoidectomia; ocasionalmente, tratamento com metimazol em baixas doses e a longo prazo pode ser adequado. - Recomendação fraca, nível de evidência moderado
Considerar o uso de beta-bloqueador após radioiodoterapia em pacientes assintomáticos com risco de complicações (por exemplo, pacientes idosos ou com comorbidades), pela possibilidade de exacerbação transitória do hipertireoidismo. - Recomendação fraca, nível de evidência baixo
Considerar tratamento com metimazol antes da radioiodoterapia em pacientes com risco de complicações pela possibilidade de exacerbação transitória do hipertireoidismo; o metimazol deve ser descontinuado 2-3 dias antes do radioiodo. - Recomendação fraca, nível de evidência moderado
Considerar reintrodução do metimazol 3-7 dias após a administração de radioiodo em pacientes com risco de complicações pela possibilidade de exacerbação transitória do hipertireoidismo. - Recomendação fraca, nível de evidência baixo
Administrar dose única suficiente de radioiodo para aliviar o hipertireoidismo em pacientes com BMT ou AT (dose fixa ou calculada de acordo com tamanho do bócio ou nódulo). - Recomendação forte, nível de evidência moderado.
Acompanhar a resposta ao tratamento com o radioiodo após 1-2 meses, com dosagem de T4L, T3 total e TSH; manter a monitorização bioquímica em intervalos de 4-6 semanas por 6 meses, ou até que o paciente evolua para hipotireioidismo e esteja com reposição estável de hormônio tireoidiano. - Recomendação forte, nível de evidência baixo
Em caso de hipertireoidismo persistente após 6 meses do radioiodo, realizar novo tratamento com radioiodoterapia; em pacientes com resposta mínima após 3 meses, já considerar terapia adicional com radioiodo. - Recomendação fraca, nível de evidência baixo
Em caso de tratamento cirúrgico, manter o paciente eutireoideo no pré-operatório com uso de metimazol, com ou sem betabloqueador; não utilizar solução com iodeto de potássio nesses casos. - Recomendação forte, nível de evidência baixo
Suspender a droga antitireoidiana (DAT) no momento da tireoidectomia e reduzir gradualmente o beta-bloqueador após a cirurgia. - Recomendação forte, nível de evidência baixo
Tratar pacientes com BMT cirurgicamente com tireoidectomia quase total ou total. - Recomendação forte, nível de evidência moderado
No pós-operatório de tireoidectomia por BMT, dosar de cálcio com ou sem PTH e suplementar cálcio oral e calcitriol conforme esses resultados. - Recomendação fraca, nível de evidência baixo
Após a tireoidectomia por BMT, iniciar levotiroxina na dose apropriada para o peso do paciente (1,6 μg/kg), com doses um pouco menores em pacientes idosos, e dosar o TSH a cada 1-2 meses até estável, e após anualmente. - Recomendação forte, nível de evidência baixo
Em caso de tratamento cirúrgico para adenoma tóxico, solicitar antes um ultrassom de tireoide para avaliar toda a glândula; tratar adenomas tóxicos isolados com lobectomia. - Recomendação forte, nível de evidência moderado
Após a lobectomia por adenoma tóxico, dosar o TSH e T4L de 4 a 6 semanas após a cirurgia e iniciar suplementação com hormônio tireoidiano em caso de elevação persistente do TSH acima do valor de referência. - Recomendação forte, nível de evidência baixo
Em caso de hipertireoidismo persistente ou recorrente após a cirurgia para BMT ou AT, indicar radioiodoterapia como tratamento de escolha. - Recomendação forte, nível de evidência baixo
Considerar tratamento a longo prazo com metimazol para BMT ou AT em pacientes idosos ou com comorbidades e expectativa de vida limitada, pacientes que não são bons candidatos para cirurgia ou ablação, e em pacientes que preferem essa opção. - Recomendação fraca, nível de evidência baixo
O tratamento com DAT não induz remissão em pacientes com BMT ou AT, e a descontinuação do tratamento resulta em recidiva.
Considerar terapias alternativas, como ablação com etanol ou radiofrequência, em pacientes selecionados com BMT ou AT que possuem contraindicações ou recusam tratamento com radioiodo, cirurgia ou DAT a longo prazo. - Sem recomendação, nível de evidência insuficiente
Hipertireoidismo Subclínico
Em caso de TSH persistentemente <0,1 mU/L, tratar o hipertireoidismo subclínico em todos os indivíduos com ≥ 65 anos, pacientes com fatores de risco cardíacos, doença cardíaca ou osteoporose, mulheres pós-menopausa que não estejam usando estrógenos ou bifosfonatos, e indivíduos com sintomas de hipertireoidismo. - Recomendação forte, nível de evidência moderado
Em caso de TSH persistentemente <0,1 mU/L, considerar o tratamento do hipertireoidismo subclínico em indivíduos assintomáticos com < 65 anos e sem os fatores de risco descritos acima. - Recomendação fraca, nível de evidência moderado
Em caso de TSH persistentemente abaixo do limite inferior da normalidade, mas ≥ 0,1 mU/L, considerar o tratamento do hipertireoidismo subclínico em indivíduos ≥ 65 anos e em pacientes com doença cardíaca, osteoporose ou sintomas de hipertireoidismo. - Recomendação fraca, nível de evidência moderado
Em caso de TSH persistentemente abaixo do limite inferior da normalidade, mas ≥ 0,1 mU/L, manter observação em pacientes assintomáticos com < 65 anos e sem doença cardíaca ou osteoporose, sem necessidade de investigação etiológica adicional ou tratamento. - Recomendação fraca, nível de evidência baixo
Em caso de indicação de tratamento do hipertireoidismo subclínico, a escolha do tratamento deve ser guiada de acordo com a etiologia e seguir os mesmos princípios do tratamento do hipertireoidismo clínico. - Recomendação forte, nível de evidência baixo
Tireotoxicose Induzida por Amiodarona e por Iodo
Não administrar droga antitireoidiana de rotina antes do uso de contraste iodado. - Recomendação fraca, nível de evidência baixo
Utilizar agentes beta-bloqueadores isoladamente ou em associação com metimazol no tratamento do hipertireoidismo induzido por iodo. - Recomendação forte, nível de evidência baixo
Monitorizar a função tireoidiana antes e nos primeiros 3 meses após o início da terapia com amiodarona, e posteriormente a cada 3-6 meses. - Recomendação fraca, nível de evidência baixo
Decidir individualmente sobre a necessidade de suspender a amiodarona em caso de tireotoxicose, após discussão com o cardiologista, considerando o quadro clínico e a possibilidade de terapia antiarrítmica alternativa eficaz. - Recomendação forte, nível de evidência baixo
Dosar exames de função tireoidiana em pacientes estáveis para avaliar distúrbios associados ao hipertireoidismo induzido por amiodarona, especificamente bócio multinodular tóxico e Doença de Graves previamente oculta (tireotoxicose induzida por amiodarona tipo 1). - Recomendação forte, nível de evidência baixo
Utilizar metimazol para o tratamento de tireotoxicose em pacientes com nódulo tireoidiano autônomo ou Doença de Graves como a causa da tireotoxicose induzida por amiodarona (tipo 1), e corticoide para pacientes com tireoidite induzida por amiodarona (tipo 2). - Recomendação forte, nível de evidência baixo
Utilizar o uso combinado de DAT e corticoide em pacientes com tireotoxicose induzida por amiodarona que estejam clinicamente instáveis ou que apresentem falha a uma única modalidade de tratamento, ou quando a causa da tireotoxicose não puder ser inequivocamente determinada. - Recomendação forte, nível de evidência baixo
Realizar tireoidectomia em pacientes com tireotoxicose induzida por amiodarona que não respondem à terapia médica agressiva com metimazol e corticoide. - Recomendação forte, nível de evidência baixo
Tireotoxicose por Tireoidite
Prescrever beta-bloqueadores e anti-inflamatórios não esteroidais (AINEs) para o tratamento da tireoidite subaguda sintomática leve; substituir os AINEs por corticoide em caso de falha na resposta terapêutica ou em apresentações iniciais com dor moderada a severa e/ou sintomas tireotóxicos. - Recomendação forte, nível de evidência baixo
Tratar pacientes com tireotoxicose indolor sintomática com beta-bloqueadores para controle dos sintomas. - Recomendação forte, nível de evidência baixo
Tratar a tireoidite aguda com antibióticos e drenagem cirúrgica, conforme o julgamento clínico, e utilizar beta-bloqueadores para o manejo dos sintomas de tireotoxicose. - Recomendação forte, nível de evidência baixo
Outras Causas de Tireotoxicose
Monitorizar, por meio de exame clínico e laboratorial da função tireoidiana, a cada 6 meses, os pacientes em uso de medicações sabidamente associadas à tireotoxicose, como interferon-gama, interleucina-2, inibidores de tirosina-quinase e lítio. - Recomendação forte, nível de evidência baixo
Realizar o diagnóstico de adenoma hipofisário secretor de TSH nos casos em que o TSH se apresenta inapropriadamente normal ou elevado, com T4L e T3 total elevados, geralmente associado à presença de um tumor hipofisário em exames de imagem, e na ausência de história familiar ou teste genético compatível com resistência aos hormônios tireoidianos. - Recomendação forte, nível de evidência baixo
Indicar ressecção cirúrgica realizada por um neurocirurgião experiente para pacientes com adenomas hipofisários secretores de TSH. - Recomendação forte, nível de evidência baixo
Para pacientes com diagnóstico de struma ovarii, indicar a ressecção cirúrgica do tumor após a normalização pré-operatória dos níveis de hormônios tireoidianos. - Recomendação forte, nível de evidência baixo
Para pacientes com hipertireoidismo devido a coriocarcinoma, indicar o tratamento com metimazol, associado ao tratamento direcionado para o tumor primário. - Recomendação forte, nível de evidência baixo
Nódulo de Tireoide em Paciente com Hipertireoidismo
Em caso de descoberta de um nódulo tireoidiano não-funcionante em pacientes com hipertireoidismo (seja por Doença de Graves, bócio multinodular tóxico ou adenoma tóxico), avaliar e tratar o nódulo conforme as diretrizes para nódulos tireoidianos em indivíduos eutireoidianos. - Recomendação forte, nível de evidência moderado
Autor do conteúdo
Bibiana Boger
Referências
Públicação Oficial
https://app.doctodoc.com.br/conteudos/como-eu-trato-o-hipertireoidismo-e-a-tireotoxicose
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