Como Eu Investigo e Trato Incidentaloma Adrenal Com Base na Diretriz Conjunta da Sociedade Europeia de Endocrinologia e Rede Europeia para o Estudo de Tumores Adrenais 2023
18 de setembro de 2024
5 minutos de leitura
Incidentalomas adrenais são massas detectadas em exames de imagem realizados por outros motivos que não envolvem a suspeita de doença adrenal, excluindo geralmente pacientes com síndromes hereditárias de risco ou estadiamento de malignidades extra-adrenais. Historicamente, usa-se um limiar de ≥ 1 cm para investigar essas lesões. A maioria dos incidentalomas é benigna e não funcionante, mas é crucial identificar pacientes com risco de malignidade e/ou produção hormonal excessiva.
A diretriz foi desenvolvida em conjunto pela ESE (The European Society of Endocrinology) e pela ENSAT (European Network for the Study of Adrenal Tumors), com o propósito de definir os critérios de avaliação e tratamento de incidentalomas adrenais.
O método adotado foi o GRADE (Grading of Recommendations Assessment, Development And Evaluation) para a estratificação da força das evidências encontradas na literatura, classificadas em quatro níveis: muito baixo, baixo, moderado e alto.
Avaliação do Risco de Malignidade
Tomografia Computadorizada (TC) sem Contraste:
Solicitar TC sem contraste para avaliar se a massa adrenal é homogênea e seu conteúdo lipídico (evidência moderada).
Se a TC mostrar massa homogênea com Unidades Hounsfield (HU) ≤ 10:
Considerar a lesão benigna; não há necessidade de seguimento com imagem (evidência moderada).
Se a TC mostrar massa homogênea com HU entre 11 e 20 e tamanho < 4 cm:
Solicitar imagem de seguimento imediato ou controle em 12 meses (evidência baixa).
Casos com Maior Risco de Malignidade:
Massa adrenal ≥ 4 cm, heterogênea ou com HU > 20:
A cirurgia é geralmente indicada. Pode-se considerar seguimento com imagens adicionais em casos selecionados (evidência muito fraca).
Antes da cirurgia, solicitar TC de tórax e/ou PET-FDG para estadiamento (evidência muito fraca).
Abordagem Individualizada:
Para massas que não se enquadram nas categorias acima:
Adotar uma abordagem individualizada, com discussão em equipe multidisciplinar (evidência muito fraca).
4. Outras Considerações:
Biópsia adrenal:
Não recomendada durante a investigação, exceto em caso de histórico de malignidade extra-adrenal.
Suspeita de carcinoma adrenocortical:
Se houver suspeita pela imagem ou sinais clínicos de excesso de andrógenos ou estrógenos, dosar esteroides sexuais e precursores da esteroidogênese (evidência fraca).
Investigação de Excesso Hormonal
Avaliação Inicial:
Avaliar sinais e sintomas de excesso hormonal em todos os pacientes com incidentaloma adrenal.
Teste de Supressão com Dexametasona:
Solicitar cortisol após teste de supressão com 1 mg de dexametasona em todos os pacientes (evidência moderada), exceto em pacientes frágeis com baixa expectativa de vida.
Interpretar os resultados como uma variável contínua (evidência muito fraca). Usar ponto de corte de ≤ 1,8 μg/dL para excluir secreção autônoma de cortisol (evidência fraca).
Em pacientes com cortisol > 1,8 μg/dL (repetido e confirmado) sem sinais de síndrome de Cushing, diagnosticar como secreção autônoma leve de cortisol (evidência fraca). Confirmar que a secreção é ACTH-independente e que não há fatores interferentes na interpretação.
Exames Adicionais e Risco de Síndrome de Cushing:
Exames adicionais para avaliar o grau de secreção de cortisol podem ser úteis.
Considerar que a secreção autônoma leve de cortisol tem risco muito baixo (<1%) de evoluir para síndrome de Cushing clínica (evidência moderada).
Rastreamento e Monitoramento:
Realizar rastreio de hipertensão arterial e diabetes tipo 2 (evidência fraca), além de fraturas vertebrais (evidência muito fraca), em pacientes com secreção autônoma leve de cortisol.
Tratamento Cirúrgico:
A indicação de adrenalectomia unilateral deve ser individualizada, considerando idade, sexo, comorbidades, grau e persistência da elevação de cortisol pós-dexametasona, e a preferência do paciente (evidência muito fraca).
Exclusão de Feocromocitoma e Hiperaldosteronismo:
Solicitar metanefrinas livres plasmáticas ou urinárias fracionadas para excluir feocromocitoma em todos os pacientes com lesões adrenais não típicas de adenoma benigno (HU sem contraste > 10).
Solicitar e calcular a razão aldosterona/renina em todos os pacientes com lesão adrenal e hipertensão e/ou hipocalemia inexplicada concomitante.
Tratamento Cirúrgico
Adrenalectomia Minimamente Invasiva:
Indicada como tratamento de escolha para tumores adrenais unilaterais com produção hormonal excessiva clinicamente relevante (evidência muito fraca).
Pode ser realizada para tumores suspeitos de malignidade com ≤ 6 cm e sem sinais de invasão, por um cirurgião experiente (evidência muito fraca).
Adrenalectomia Aberta:
Recomendada em casos de tumores com sinais de invasão local (evidência muito fraca).
Casos Assintomáticos com Lesões Benignas:
O tratamento cirúrgico não é indicado para pacientes com lesões claramente benignas, unilaterais e não funcionantes (evidência fraca).
Decisão Individualizada:
Para casos não enquadrados nas situações acima, a decisão deve ser individualizada por uma equipe multidisciplinar de especialistas (evidência muito fraca).
Glicocorticoide Perioperatório:
Administrar glicocorticoide em dose de estresse no perioperatório para todos os pacientes submetidos à cirurgia com cortisol pós-dexametasona > 1,8 μg/dL.
Seguimento
Pacientes com Massas Adrenais Indeterminadas:
Se a decisão for não realizar adrenalectomia, realizar uma nova TC sem contraste ou RM após 6 a 12 meses para monitorar o crescimento da massa (evidência muito fraca).
Considerar ressecção cirúrgica se houver crescimento significativo (≥ 20% no diâmetro máximo e pelo menos 5 mm).
Avaliação da Produção Hormonal:
Se a produção hormonal for normal, não é necessário repetir a avaliação, a menos que o paciente desenvolva novos sinais ou sintomas de excesso hormonal ou haja piora das comorbidades, como hipertensão arterial sistêmica (HAS) e diabetes tipo 2 (DM2) (evidência fraca).
Pacientes com Secreção Autônoma Leve de Cortisol:
Para pacientes que não são submetidos à cirurgia, recomenda-se seguimento anual das comorbidades (evidência fraca).
Em caso de piora das comorbidades, reavaliar a produção hormonal e reconsiderar a intervenção cirúrgica.
Circunstâncias Especiais - Incidentalomas Bilaterais
Em caso de massas bilaterais ou múltiplas, cada lesão deve ser avaliada individualmente com base nos achados em exames de imagem, a fim de estabelecer o risco de malignidade de cada nódulo. A avaliação da produção hormonal deve ser realizada da mesma forma que para lesões unilaterais
Para doença bilateral, classificar os pacientes em um dos seguintes 4 grupos (pacientes que não se enquadram em nenhum dos grupos a seguir devem ter um plano terapêutico individualizado)
Hiperplasia bilateral (macronodular)
Adenomas adrenais bilaterais
Duas massas morfologicamente semelhantes, não sugestivas de adenoma
Duas massas morfologicamente diferentes
Em pacientes com hiperplasia bilateral sem secreção autônoma de cortisol, dosar 17-OH-progesterona para excluir hiperplasia adrenal congênita por deficiência de 21-hidroxilase
Para pacientes com hiperplasia bilateral (macronodular) ou adenomas bilaterais, avaliar as comorbidades possivelmente atribuídas à secreção autônoma leve de cortisol
Em pacientes com metástases, linfoma, doença inflamatória infiltrativa ou hemorragia bilaterais, avaliar a possibilidade de insuficiência adrenal com dosagem de cortisol sérico matinal e ACTH
Em pacientes com hiperplasia bilateral ou adenomas bilaterais e secreção autônoma de cortisol, o tratamento deve ser individualizado; não realizar adrenalectomia bilateral em pacientes sem sinais clínicos evidentes de síndrome de Cushing
Circunstâncias Especiais - Pacientes jovens e idosos
A avaliação de incidentalomas em gestantes e pacientes com menos de 40 anos deve ser urgente, devido ao maior risco de malignidade e produção hormonal
Em crianças, adolescentes ou gestantes, utilizar ressonância magnética como método de imagem preferencial
Em caso de massas indeterminadas em crianças, adolescentes, gestantes ou adultos com menos de 40 anos, dar preferência ao tratamento cirúrgico
Circunstâncias Especiais - Malignidade extra-adrenal
Medir metanefrinas plasmáticas ou urinárias para excluir feocromocitoma em pacientes com massas indeterminadas e malignidade extra-adrenal, mesmo que a massa seja uma provável metástases
Em pacientes com malignidade extra-adrenal e lesão adrenal com características de benignidade, não há necessidade de prosseguir com investigação ou seguimento
Em pacientes com malignidade extra-adrenal, o PET-FDG com captação elevada nas adrenais sugere metástase
Em pacientes com lesões indeterminadas e malignidade extra-adrenal, em que o manejo clínico será alterado pela demonstração de que a lesão adrenal é maligna, prosseguir investigação com PET-FDG, ressecção cirúrgica ou biópsia. Para os demais pacientes, seguir com imagem no mesmo intervalo do seguimento do tumor primário
Para a realização de biópsia adrenal, é necessário garantir que a lesão é hormonalmente inativa (particularmente excluir feocromocitoma), que a imagem não é característica de benignidade e que o manejo clínico do paciente será alterado pelo conhecimento da histologia da lesão
Autor do conteúdo
Bibiana Boger
Referências
Públicação Oficial
https://app.doctodoc.com.br/conteudos/como-eu-investigo-e-trato-incidentaloma-adrenal-com-base-na-diretriz-conjunta-da-sociedade-europeia-de-endocrinologia-e-rede-europeia-para-o-estudo-de-tumores-adrenais-2023
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