Como eu Faço o Diagnóstico de Polineuropatia Desmielinizante Inflamatória Crônica
21 de fevereiro de 2025
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Racional
A polineuropatia desmielinizante inflamatória crônica (CIDP), também conhecida como polirradiculoneuropatia desmielinizante inflamatória crônica, é uma neuropatia adquirida, imunomediada, que afeta os nervos periféricos e as raízes nervosas. Geralmente, é caracterizada por um curso de fraqueza simétrica, proximal e distal, com evolução em padrão recorrente-remitente ou progressivo. Diferentemente da polirradiculoneuropatia aguda desmielinizante inflamatória (AIDP), variante da Síndrome de Guillain Barré, o CIDP tem um curso crônico.
O diagnóstico baseia-se em uma combinação de características clínicas, eletrofisiológicas e laboratoriais, com exclusões de outras condições que podem mimetizar a CIDP. Apesar da diretriz da EFNS/PNS de 2010 apresentar alta precisão diagnóstica e ampla aceitação mundial em pesquisa, erros de diagnóstico são comuns, especialmente em variantes de CIDP, devido a falhas na interpretação de testes diagnósticos. Este texto apresenta as principais informações acerca do diagnóstico de CIDP apresentados na revisão atual da diretriz e busca melhorar a especificidade dos critérios.
A diretriz foi elaborada com base na ferramenta AGREE II e na metodologia GRADE para formulação das recomendações. Foram desenvolvidas doze perguntas PICO (participantes, intervenção, controle e desfecho) que orientaram a busca sistemática, sendo as perguntas de 1 a 7 relacionadas ao diagnóstico. Apenas a pergunta 1 foi avaliada utilizando a abordagem formal da metodologia GRADE; nas demais, devido à limitação das evidências disponíveis, o grupo de trabalho chegou a um consenso e apresentou orientações como pontos de boa prática. As recomendações foram revisadas iterativamente até atingir consenso.
Recomendações
Critérios de Diagnóstico
O diagnóstico da polineuropatia desmielinizante inflamatória crônica (CIDP) é baseado em critérios clínicos que devem ser confirmados por meio de estudos neurofisiológicos. Considerando os critérios clínicos, as apresentações são classificadas com "CIDP típica" e "variantes de CIDP", abandonando-se o uso do termo "CIDP atípica".
CIDP Típica: todos os seguintes critérios clínicos devem ser preenchidos:
Fraqueza muscular progressiva ou recorrente, simétrica, proximal e distal dos membros superiores e inferiores, com envolvimento sensitivo de pelo menos dois membros.
Desenvolvimento ao longo de pelo menos 8 semanas.
Reflexos osteotendíneos ausentes ou reduzidos em todos os membros.
Variantes de CIDP: cada variante tem critérios clínicos específicos
CIDP distal: perda sensitiva distal e fraqueza muscular predominante nos membros inferiores.
CIDP multifocal: perda sensitiva e fraqueza muscular em um padrão multifocal, geralmente assimétrico, predominante nos membros superiores, em mais de um membro.
CIDP focal: perda sensitiva e fraqueza muscular em apenas um membro.
CIDP motor: sintomas e sinais motores sem envolvimento sensitivo.
CIDP sensitivo: sintomas e sinais de sensibilidade sem envolvimento motor.
Nota do autor: A CIDP típica pode se apresentar de forma aguda (A-CIDP). Em contraste com a síndrome de Guillain-Barré, os pacientes com A-CIDP continuam a piorar por mais de oito semanas após o início dos sintomas ou apresentam pelo menos três recaídas após uma melhora inicial.
Critérios neurofisiológicos (PICO 1)
Deve-se utilizar o estudo neurofisiológico (estudos de condução nervosa motora e sensitiva) para a complementação dos critérios clínicos para o diagnóstico de CIDP, classificando os resultados como CIDP ou CIDP possível - recomendação forte.
CIDP típico:
Pelo menos dois nervos motores devem apresentar anormalidades que atendam aos critérios de desmielinização na condução motora.
As anormalidades na condução sensitiva devem estar presentes em pelo menos dois nervos.
Em pacientes com critérios clínicos de CIDP típica, mas sem critérios eletrodiagnósticos mínimos, o diagnóstico de "CIDP típica possível" pode ser feito se houver melhora objetiva após tratamento com IVIg, corticosteroides ou troca plasmática e se houver pelo menos um critério adicional de suporte (vide a seguir).
CIDP distal:
Pelo menos dois nervos dos membros superiores devem preencher os critérios de desmielinização na condução motora. A amplitude do pico negativo do potencial de ação muscular composto (CMAP) distal deve ser de pelo menos 1 mV.
Quando os critérios são atendidos em dois nervos do membro inferior, mas não do superior, ou se forem atendidos em apenas um nervo do membro superior, a certeza diagnóstica máxima atribuída é "CIDP distal possível".
As anormalidades na condução sensorial devem estar presentes em pelo menos dois nervos.
CIDP multifocal e focal
Os critérios de condução motora devem ser atendidos em pelo menos dois nervos de mais de um membro para o diagnóstico de CIDP multifocal e em pelo menos dois nervos de um único membro para o diagnóstico de CIDP focal.
Quando os critérios são atendidos em apenas um nervo, a certeza diagnóstica máxima é "CIDP multifocal possível" ou "CIDP focal possível".
Anormalidades de condução sensitiva devem estar presentes em pelo menos dois nervos dos membros afetados para o diagnóstico de CIDP multifocal ou focal, e em um nervo do membro afetado para o diagnóstico de "CIDP focal possível".
CIDP motora (e CIDP predominantemente motora)
A CIDP motora deve preencher os critérios de condução motora em pelo menos dois nervos, e a condução sensitiva deve ser normal em pelo menos quatro nervos (mediano, ulnar, radial e sural) para confirmar o seu diagnóstico.
Caso os critérios sejam preenchidos em apenas um nervo motor, o diagnóstico é "CIDP motora possível".
A CIDP motora com anormalidades na condução sensitiva em dois nervos é diagnosticada como CIDP “predominantemente motora”.
CIDP sensitiva (e CIDP predominantemente sensitiva)
A CIDP sensitiva deve cumprir os critérios de condução sensitiva, com anormalidades em ao menos dois nervos, e a condução motora deve ser normal em pelo menos quatro nervos (mediano, ulnar, peroné e tibial) para confirmar o diagnóstico clínico.
A certeza diagnóstica máxima é CIDP sensitiva possível.
A CIDP sensitiva com critérios de condução motora preenchidos em um nervo é diagnosticada como “CIDP predominantemente sensitiva possível”. Caso os critérios de condução motora forem preenchidos em dois nervos, a certeza diagnóstica aumenta para “CIDP predominantemente sensitiva”.
Critérios de Suporte (PICO 2, PICO 3, PICO 4 e PICO 6).
A resposta ao tratamento com agentes imunomoduladores, como imunoglobulina endovenosa, plasmaférese e corticoides (PICO 2) auxilia o diagnóstico clínico de CIDP em pacientes nos quais os critérios clínicos, eletrofisiológicos e outros critérios de suporte permitam apenas o diagnóstico de CIDP possível - ponto de boa prática.
Em relação aos exames imagem (PICO 3), sugere-se o uso de ultrassom em pacientes adultos para diagnosticar CIDP nos casos de CIDP possível; além disso, sugere-se não utilizar a ressonância magnética em pacientes adultos para diagnosticar CIDP, exceto em CIDP possível - ponto de boa prática.
A análise de líquido cefalorraquidiano (PICO 4) não é necessária se os critérios diagnósticos para CIDP já forem atendidos, mas deve ser considerada em casos de diagnóstico incerto, início agudo ou subagudo, suspeita de infecção ou malignidade - ponto de boa prática.
A biópsia de nervo (PICO 6) não é recomendada como rotina para o diagnóstico de CIDP, sendo indicada apenas quando o diagnóstico for incerto após outros exames ou quando houver resposta inadequada ao tratamento, desde que os sintomas sejam suficientemente graves para justificar a morbidade potencial associada à biópsia de nervo - ponto de boa prática.
Investigação Adicional:
A diretriz recomenda fortemente a realização dos seguintes exames para toda as formas de CDPI:
Estudo neurofisiológico
Pesquisa de proteína monoclonal sérica e urinária por imunofixação
Glicemia de jejum
Hemograma
Função renal
Função hepática
Os exames a serem realizados conforme indicação clínica específica em CIDP e nas CIDP variantes, como ponto de boa prática, são:
Ultrassonografia do plexo braquial e raízes cervicais
Ressonância magnética das raízes cervicais e lombossacrais
Exame de LCR
Biópsia de nervo
Hemoglobina glicada (HbA1c)
Sorologia para Borrelia burgdorferi
Proteína C-reativa
FAN
Sorologia para HIV
Fator de crescimento endotelial vascular sérico (VEGF)
Anticorpos anti-MAG (quando há gamopatia monoclonal IgM)
Anticorpos contra proteínas nodo-paradonais
Radiografia esquelética
Raio-X do tórax
Testes genéticos para neuropatia hereditária
Algumas investigações adicionais são sugeridas em variantes de CIDP - ponto de boa prática.
CIDP Distal: anticorpos anti-MAG quando houver gamopatia monoclonal IgM.
CIDP Multifocal e Focal: VHS; FAN e ANCA; anticorpos anti-GM1 IgM.
CIDP Motor: CPK; Biópsia muscular; avaliação da junção neuromuscular (estimulação repetitiva, anticorpos contra receptores de acetilcolina, MuSK ou canais de cálcio voltagem-dependentes pré-sinápticos).
CIDP Sensitivo: neuropatia paraproteinêmica IgM com anticorpos anti-MAG (neuropatia anti-MAG); anticorpos antigangliosídeos; vitaminas B12 e B6; rastreamento de anticorpos paraneoplásicos; potenciais evocados somatossensoriais quando os estudos de condução nervosa forem normais.
Autor do conteúdo
Fernando Falcão
Referências
Públicação Oficial
https://app.doctodoc.com.br/conteudos/como-eu-faco-o-diagnostico-de-polineuropatia-desmielinizante-inflamatoria-cronica
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