Colchicina na Síndrome de Behçet
18 de fevereiro de 2025
6 minutos de leitura
Colchicina é eficaz para as diversas manifestações mucocutâneas e articulares da doença de Behçet, quando comparado a placebo?
A colchicina é amplamente utilizada para o tratamento das diversas manifestações da doença de Behçet, mas a evidência de sua eficácia advém principalmente de estudos abertos. O efeito da medicação é atribuído à inibição da quimiotaxia de leucócitos. Em um estudo prévio com número pequeno e tempo de seguimento curto (35 pacientes por 6 meses) publicado pelo mesmo grupo1, colchicina se mostrou eficaz apenas no controle da artralgia e do eritema nodoso. Portanto, o presente estudo teve como objetivo avaliar a eficácia de colchicina em 2 anos em uma amostra maior de pacientes com doença de Behçet de ambos os sexos.
Ensaio clínico randomizado
Unicêntrico (Centro de pesquisa multidisciplinar em Behçet – Cerrahpaşa Medical School – Universidade de Istambul - Turquia)
Duplo cego
Controlado por placebo
Randomização 1:1 para colchicina ou placebo, estratificada por sexo
Pacientes com Doença de Behçet recrutados entre novembro/1991 e dezembro/1995
Diagnóstico de acordo com os critérios do Grupo Internacional de Estudos em Doença de Behçet (ISGBD) de 1990
Idade entre 18 e 35 anos
Doença em atividade, definida pela presença mínima de úlceras orais ou genitais ou eritema nodoso pelo menos 3 vezes nos últimos 6 meses
Duração da doença ≤2 anos
Uso de glicocorticoides, colchicina ou imunossupressores nos últimos 6 meses
Envolvimento orgânico indicativo de imunossupressão
Doença ocular, especialmente com envolvimento retiniano
Colchicina 0,5 mg/cp:
2 cp/dia se peso <50 kg – dose diária 1 mg
2 cp/3 cp (em dias alternados) se peso 50-59 kg – dose diária média 1,25 mg
3 cp/dia se peso 60-75 kg – dose diária 1,5 mg
3 cp/4 cp (em dias alternados) se peso 76-84 kg – dose diária média 1,75 mg
4 cp/dia se peso ≥85 kg – dose diária 2 mg
Placebo visualmente idêntico à colchicina em número semelhante de cápsulas de acordo com o peso.
Primário: ausência completa de úlceras orais, úlceras genitais, eritema nodoso, lesões foliculares e artrite durante o período do estudo.
Secundários: diferença no número médio de lesões mucocutâneas ou de articulações com artrite em cada grupo.
MasculinoFeminino
116 participantes incluídos (60 homens e 56 mulheres)
Colchicina (N=58) x Placebo (N=58):
Idade média: 26,8 x 27,2 anos
Duração média da doença: 8,1 x 8,6 meses
Manifestações clínicas:
Úlceras orais: 100% x 100%
Úlceras genitais: 89,6% x 81%
Foliculite: 79,3% x 77,6%
Eritema nodoso: 55,2% x 53,4%
Artrite: 19% x 34,5%
Teste da patergia positivo: 82,8% x 81%
Os desfechos primário e secundário foram avaliados separadamente em pacientes do sexo masculino e feminino e por manifestação da doença:
Artrite:
91% das mulheres do grupo colchicina não tiveram artrite até o fim do estudo, versus 64% no grupo placebo (χ2=4,55, P=0,03). Os valores equivalentes entres os participantes do sexo masculino foram de 86% e 56%, respectivamente (χ2=6,31, P=0,01).
O número médio de articulações inflamadas foi menor no grupo colchicina quando comparado ao grupo placebo, tanto em mulheres (0,3 x 2,4, P=0,01) como em homens (2,8 x 4,4, P=0,03).
Eritema nodoso:
79% das mulheres no grupo colchicina não tiveram eritema nodoso durante o estudo, comparado a 39% no grupo placebo (χ2=8,10, P=0,004). Entre os homens não houve diferença estatística neste desfecho (76% no grupo colchicina x 60% no grupo placebo, χ2=3,30, P=0,07).
O número médio de lesões de eritema nodoso foi menor em mulheres do grupo colchicina quando comparado a mulheres do grupo placebo (1,4 x 6,0, P=0,002), mas em homens esta diferença não foi observada (0,7 x 2,0, P=0,2).
Úlceras genitais:
89% das mulheres no grupo colchicina permaneceram livres de úlceras genitais, versus 46% no grupo placebo (χ2=8,27, P=0,004). Não houve diferença entre os homens.
O número médio de úlceras genitais foi menor em mulheres do grupo colchicina quando comparado a mulheres do grupo placebo (0,1 x 2,6, P=0,001). Não houve diferença entre os homens.
Não houve diferença na ocorrência ou no número médio de úlceras orais entre os grupos colchicina e placebo, tanto em homens como em mulheres.
Não houve diferença na ocorrência ou no número médio de lesões foliculares (foliculite) entre os grupos colchicina e placebo, tanto em homens como em mulheres.
A taxa de efeitos adversos foi similar entre os grupos colchicina e placebo. Os efeitos adversos observados foram perda de apetite, náusea, dor abdominal e diarreia. Todos foram considerados leves e se resolveram.
84 pacientes (72%) completaram os 24 meses de seguimento.
As taxas de adesão ao tratamento (pela contagem de cápsulas retornadas) foram de 91% em mulheres do grupo colchicina, 95% de mulheres do grupo placebo, 91% em homens do grupo colchicina e 92% em homens do grupo placebo.
Colchicina foi útil para o tratamento de artrite e algumas das manifestações mucocutâneas na doença de Behçet. O efeito parece ser melhor entre pacientes do sexo feminino.
Desenho apropriado (ensaio clínico randomizado duplo-cego controlado).
Tempo de seguimento considerável para avaliação do desfecho (24 meses).
Avaliação do desfecho de acordo com o sexo do paciente.
Monitorização de efeitos adversos.
Número de eventos relativamente pequeno para avaliação de desfechos em que se observou uma tendência (possível erro tipo beta).
Estudo unicêntrico sem a descrição dos grupos étnicos incluídos, para uma doença que se expressa de forma heterogênea globalmente.
A avaliação de desfechos separada por sexo, embora traga informações interessantes a respeito das diferentes respostas entre homens e mulheres, reduz ainda mais uma amostra de pacientes que já é pequena.
Autor do conteúdo
Marília Furquim
Referências
Públicação Oficial
https://app.doctodoc.com.br/conteudos/colchicina-na-sindrome-de-behcet
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