Cladribina Oral Adicionada ao IFN-β no Tratamento da Esclerose Múltipla Recidivante Ativa.
20 de março de 2025
6 minutos de leitura
Em pacientes com esclerose múltipla remitente-recorrente ativa, a adição de cladribina ao IFN-β, é segura e bem tolerada em comparação com placebo?
A quantidade de terapias modificadoras da doença disponíveis para o tratamento da esclerose múltipla recidivante-remitente (EMRR) aumentou nos últimos anos, mas muitos pacientes continuam a apresentar surtos e progressão da doença, o que indica a necessidade de novas opções de tratamento. Uma estratégia possível é combinar agentes eficazes para suprimir a atividade da doença de forma mais eficaz. A cladribina, um análogo sintético da desoxiadenosina, consegue reduzir sustentadamente os linfócitos T e B, envolvidos na patogênese da EM. Estudos prévios já apontam esses efeitos e provável benefício clínico. Além disso, o regime via oral da cladribina oferece uma posologia confortável aos pacientes, diferentemente de outras terapias disponíveis. Portanto, este estudo de fase 2 avaliou a segurança como objetivo primário e, secundariamente, os potenciais benefícios do tratamento com cladribina em pacientes com surtos e progressão da doença enquanto em tratamento com interferon (IFN)-β.
Ensaio clínico randomizado fase 2
Multicêntrico (50 centros em 4 países: EUA, Rússia, Espanha e Itália)
Duplo cego
Controlado por placebo
Randomização planejada em proporção de 2:1 (cladribina + interferon beta vs. placebo + interferon beta), mas a distribuição real dos participantes resultou em uma proporção de 2,6:1 devido à estratificação por local do estudo e tipo de interferon beta utilizado.
Duração: 96 semanas
Cálculo de 132 participantes para um poder estatístico de 80%, com nível de significância bicaudal de 0,05.
Pacientes com esclerose múltipla remitente-recorrente (EMRR) ou esclerose múltipla secundária progressiva (EMSP) com surtos (critérios de McDonald, 2005).
Idade entre 18 e 65 anos
Tratamento com IFN-β por ≥48 semanas consecutivas antes da triagem, com pelo menos 1 surto nesse período.
Estabilidade clínica (exceto surtos) nos 28 dias anteriores à triagem.
Escore na Expanded Disability Status Scale (EDSS) entre 1,0 e 5,5.
Parâmetros hematológicos normais dentro de 28 dias antes do início do estudo:
Presença de doenças infecciosas ou imunossupressoras.
Tratamento prévio com terapias imunossupressoras ou citotóxicas em qualquer momento.
Uso de terapia baseada em citocinas ou plasmaférese nos 3 meses anteriores ao início do estudo.
Uso de hormônio adrenocorticotrófico nos 28 dias anteriores ao início do estudo.
Gravidez ou amamentação.
Tentativa de concepção.
Histórico ou presença de malignidades.
Uso de corticosteroides orais ou parenterais nos 28 dias anteriores ao início do estudo.
Tratamento com imunoglobulina intravenosa nos 3 meses anteriores ao início do estudo.
Comprimidos de cladribina 3,5 mg/kg administrados anualmente em ciclos curtos, combinados com interferon beta
Inicialmente, o estudo planejava avaliar duas doses de cladribina (3,5 mg/kg e 5,25 mg/kg), com os pacientes recebendo comprimidos de 10 mg até atingir a dose acumulada correspondente. No entanto, após a identificação de linfopenia grave (88,2%) no grupo que recebeu 5,25 mg/kg, essa dose foi descontinuada. Os pacientes já randomizados para essa dose permaneceram no estudo, mas passaram a receber apenas interferon beta e foram acompanhados exclusivamente para análise de segurança.
Placebo administrado nos mesmos intervalos da cladribina, associado ao interferon beta.
Primário: segurança e tolerabilidade da cladribina associada ao interferon beta, com ênfase nos eventos adversos e toxicidade hematológica.
Secundários: número de surtos qualificáveis; tempo até o primeiro surto; número médio de novas lesões com realce por gadolínio (Gd+) em T1, lesões ativas em T2 e lesões combinadas únicas ativas na ressonância magnética (RM); tempo até a progressão confirmada do EDSS por 3 meses.
Surto: aumento de 2 pontos em ≥1 sistema funcional de Kurtzke ou de 1 ponto em ≥2 sistemas (exceto intestino/bexiga ou cognição), sem febre, durando ≥24h e após ≥30 dias de estabilidade clínica.
Progressão confirmada do EDSS: aumento de ≥1.5 pontos se EDSS inicial = 0, ≥1.0 ponto se EDSS inicial entre 0.5 e 4.5, ou ≥0.5 ponto se EDSS inicial ≥5.0, confirmado após ≥3 meses.
MasculinoFeminino
Grupo Cladribina 3,5mg/kg + IFN-β (N=124) x IFN-β (N=48)
Idade (anos): 38,5 // 40,1
Sexo feminino (%): 67,7 // 75,0
Brancos (%): 96,0 // 95,8
Peso (kg): 75,0 // 71,0
Tempo desde o primeiro surto de EM até o início do estudo (anos): 9,98 // 10,83
Tempo desde o surto mais recente até o início do estudo (meses): 5,10 // 5,39
EDSS: 2,9 // 3,0
EMRR (%): 86,3 // 83,3
EMSP com surtos (%): 13,7 // 16,7
Número de lesões T1 Gd+: 1,1 // 0,6
Número de lesões hipointensas em T1: 9,0 // 9,3
Volume da lesão T1 Gd+ (cm³): 1,5 // 1,0
Volume de lesão T2 (cm³): 10,79 // 13,67
Houve um aumento importante na incidência de linfopenia no grupo cladribina + interferon beta, com 40,3% dos pacientes relatando esse evento adverso, contra 0% no grupo placebo. Além disso, 63,7% dos pacientes tratados com cladribina desenvolveram linfopenia grau 3/4 (contagem de linfócitos <500 células/mm³), em comparação com apenas 2,1% no grupo placebo. O tempo médio para recuperação da linfopenia grau 3/4 foi de 142,5 dias.
Eventos adversos graves (SAEs) relacionados a infecções foram observados apenas nos pacientes tratados com cladribina, sendo 4 casos no protocolo alterado (3,5 mg/kg) e 2 casos no protocolo original (5,25 mg/kg).
Herpes zoster foi mais frequente no grupo cladribina, com 7 casos no protocolo alterado e 1 caso no protocolo original, enquanto nenhum caso foi registrado no grupo placebo.
Neoplasias não foram significativamente aumentadas entre os grupos.
Os pacientes tratados com cladribina + interferon beta tiveram 63% menos chances de apresentar recaídas ao longo do estudo em comparação com o grupo placebo (RR = 0,37; IC 95%: 0,22–0,63; p = 0,001).
Além disso, a formação de novas lesões T1 realçadas por gadolínio foi 90% menor no grupo cladribina, com uma média de 0,25 lesões por paciente, em comparação com 1,27 no grupo placebo (RR = 0,10; IC 95%: 0,03–0,37; p < 0,001).
A progressão confirmada da incapacidade pelo EDSS foi semelhante entre os grupos
Conclusões
Em pacientes com EM recorrente ativa apesar do tratamento com IFN-β, a adição de comprimidos de cladribina (3,5 mg/kg) apresentou um perfil de segurança limitado, com um aumento significativo na incidência de linfopenia. Apesar desse achado, a cladribina reduziu a taxa de recaídas e diminuiu a atividade inflamatória na ressonância magnética.
Ponto a Ponto
Desfechos de segurança bem definidos e objetivos.
Definição de surto e progressão de doença objetiva.
Baixa representatividade de participantes não europeus e não estadunidenses.
Não houve critérios clínicos na estratificação da randomização.
Duração curta e baixo tamanho amostral.
Não inclusão de DMDs classicamente utilizadas na doença.
Como o desfecho primário não incluiu a eficácia, os resultados positivos observados devem ser interpretados com cautela
Autor do conteúdo
Fernando Falcão
Referências
Públicação Oficial
https://app.doctodoc.com.br/conteudos/cladribina-oral-adicionada-ao-ifn-no-tratamento-da-esclerose-multipla-recidivante-ativa
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