Aspirina em Pacientes Submetidos a Cirurgia Não Cardíaca
11 de julho de 2024
6 minutos de leitura
O uso de aspirina durante o perioperatório de cirurgias não cardíacas reduz o risco de morte e infarto do miocárdio não fatal?
A aspirina, um antiagregante plaquetário, pode diminuir eventos cardiovasculares por meio da inibição da formação de trombos, um efeito bem estabelecido fora do contexto perioperatório. No entanto, apesar desse papel bem definido em outros cenários, ainda há incertezas sobre os riscos e benefícios de manter a medicação no perioperatório ou de iniciá-la em pacientes que não a utilizavam previamente. Portanto, o estudo POISE-2 avaliou o impacto da administração de baixa dose de aspirina, em pacientes submetidos a cirurgias não cardíacas, no risco de morte e infarto não fatal em 30 dias.
Ensaio clínico randomizado
Desenho 2x2 fatorial: duas intervenções (aspirina e clonidina) e seus respectivos placebos, criando quatro grupos:
Aspirina + Clonidina
Aspirina + Placebo de Clonidina
Placebo de Aspirina + Clonidina
Placebo de Aspirina + Placebo de Clonidina
Multicêntrico internacional (135 hospitais em 23 países)
Duplo cego
Placebo-controlado
Poder de amostra estimado: 10.000 pacientes para 84% de poder para detectar uma razão de risco de 0,75 no grupo da aspirina.
Pacientes com 45 anos ou mais, submetidos a cirurgias não cardíacas e com alto risco de complicações cardiovasculares, recrutados entre julho de 2010 e dezembro de 2013
Idade ≥ 45 anos, além de um ou mais dos seguintes:
Antecedente de doença arterial coronariana
Antecedente de doença arterial periférica
AVC prévio
Cirurgia vascular de grande porte
Quaisquer 3 dos 9 a seguir:
Idade ≥70 anos
Cirurgia de grande porte, definido como: intraperitoneal, intratorácica, retroperitoneal ou ortopédica grande.
Insuficiência cardíaca congestiva
AIT (ataque isquêmico transitório) prévio
Diabetes com necessidade de uso de medicamentos no momento
HAS
Creatinina pré-cirúrgica ≥2mg/dl
Tabagismo nos últimos 2 anos
Cirurgia de urgência ou emergência
Stent farmacológico há < 1 ano ou metálico há < 6 semanas.
Ter feito uso de aspirina ou outro antiplaquetário nas 72h antes da cirurgia
Úlcera péptica ativa ou sangramento gastrointestinal nas últimas 6 semanas
Sangramento intracraniano nos últimos 6 meses, ou ainda > 6 meses com causa não corrigida.
Cirurgia planejada ser intracraniana, endarterectomia de carótida ou cirurgia de retina.
Pacientes já em uso crônico de aspirina ("estrato de continuação"): suspenderam a aspirina ao menos 3 dias antes da cirurgia, receberam 200 mg de aspirina no dia da cirurgia e continuaram com 100 mg ao dia por 7 dias após a cirurgia. Depois disso, retomaram seu regime habitual de aspirina.
Pacientes sem uso prévio de aspirina ("estrato de iniciação"): receberam 200 mg de aspirina no dia da cirurgia, seguido de 100 mg ao dia por 30 dias.
Clonidina: administrada 0,2 mg de clonidina 2 a 4 horas antes da cirurgia, seguida de 0,2 mg por dia durante os primeiros 3 dias após a cirurgia.
Placebo de aspirina seguindo o mesmo esquema de dosagem de cada estrato.
Placebo de clonidina seguindo o mesmo esquema de dosagem da clonidina.
Primário: composto de morte e infarto não fatal em 30 dias
Secundários: composto de morte, infarto do miocárdio não fatal ou acidente vascular cerebral (AVC) não fatal; composto de morte, infarto do miocárdio não fatal, procedimento de revascularização miocárdica, embolia pulmonar (TEP) não fatal ou trombose venosa profunda (TVP).
MasculinoFeminino
5628 do estrato “iniciação” e 4382 do estrato “continuação”
Grupo Intervenção (N=4998) x Grupo Controle (N=5012):
Idade (anos): 68,6±10,3 x 68,6±10,3
Doença vascular: 32,7% x 32,6%
Doença arterial coronariana: 23,1% x 22,2%
Doença arterial periférica: 8,8% x 8,5%
AVC: 5,0% x 5,8%
Cirurgia de grande porte: 78,2% x 77,7%
Diabetes: 37,5% x 38,1%
Creatinina >2mg/dl: 3,3% x 3,1%
ICC: 3,7% x 3,1%
HAS: 85,6% x 86,9%
Revascularização cirúrgica prévia: 4,8% x 4,8%
Stent coronário prévio: 4,7% x 4,7%
Stent farmacológico: 1,1% x 1,3%
A administração de aspirina não reduziu significativamente a mortalidade ou o infarto do miocárdio não fatal em comparação ao placebo (Grupo Aspirina 7% versus Placebo 7,1%; HR 0,99; IC 95%: 0,86-1,15)
A incidência de infarto do miocárdio foi semelhante entre os grupos de aspirina e placebo (Grupo Aspirina 6,2% versus Placebo 6,3%; HR 0,98; IC 95%: 0,84-1,15)
A aspirina aumentou o risco de sangramento maior em comparação ao placebo (Grupo Aspirina 4,6% versus Placebo 3,8%; HR 1,23; IC 95%: 1,01-1,49)
Não houve diferença significativa na incidência de sangramentos ameaçadores à vida entre os grupos (Grupo Aspirina 1,7% versus Placebo 1,5%)
A incidência de AVC foi baixa e sem diferenças significativas na comparação geral, mas com uma pequena redução no risco para o "estrato de iniciação" da aspirina (Grupo Aspirina 0,3% versus Placebo 0,4%)
Não houve diferenças importantes entre os estratos de "iniciação" e "continuação" no risco de sangramento, infarto do miocárdio, AVC, embolia pulmonar ou morte.
Os sangramentos mais comuns foram de sítio cirúrgico (78,3%) e trato gastrointestinal (9,3%).
O uso de aspirina no perioperatório de cirurgias não cardíaca não reduziu o composto de morte e infarto não fatal em 30 dias, mas aumentou o risco de sangramento maior.
Estudo de grande porte com 10.010 pacientes incluídos e um número significativo de desfechos primários, conferindo poder estatístico para detectar diferenças clinicamente relevantes.
Estudo multicêntrico e internacional, incluindo pacientes de diversos países, inclusive países em desenvolvimento, o que aumenta sua validade externa.
Inclusão de pacientes com alto risco cardiovascular, tornando os resultados aplicáveis a uma população vulnerável.
Boa adesão aos tratamentos propostos, com mais de 80% de adesão adequada em ambos os grupos.
A maioria dos procedimentos realizados envolvia um risco real de sangramento, proporcionando um cenário adequado para avaliação dos efeitos da aspirina.
Baixa frequência de pacientes com implante prévio de stents coronarianos, limitando a aplicabilidade dos resultados para esse grupo de pacientes que são mais suscetíveis a eventos cardiovasculares ao suspender antiplaquetários.
O uso da clonidina em um desenho fatorial 2x2 pode introduzir confusão na interpretação dos efeitos específicos da aspirina, pois o impacto combinado das duas drogas não é o foco principal do estudo.
A heterogeneidade na prática clínica e na administração da aspirina entre os diferentes centros pode introduzir variações nos resultados.
A exclusão de pacientes com stents farmacológicos implantados há menos de um ano ou stents metálicos implantados há menos de seis semanas limita a generalização dos achados para esses subgrupos específicos.
Autor do conteúdo
Gerhard Lauterbach
Referências
Públicação Oficial
https://app.doctodoc.com.br/conteudos/aspirina-em-pacientes-submetidos-a-cirurgia-nao-cardiaca
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