Apixabana para Prevenção de Recorrência Após Acidente Vascular Encefálico Criptogênico em Pacientes com Cardiopatia Atrial
13 de junho de 2024
7 minutos de leitura
A anticoagulação é superior à terapia antiplaquetária para prevenção de recorrência de AVC em pacientes com cardiopatia atrial?
A cardiopatia atrial é definida como qualquer alteração complexa de estrutura, arquitetura, contratilidade ou eletrofisiologia afetando o átrio, com o potencial de gerar manifestações clínicas relevantes. Tal cardiopatia é fortemente associada à fibrilação atrial incidente e exerce um papel no tromboembolismo relacionado à fibrilação atrial. Vários marcadores de cardiopatia atrial estão associados ao risco de acidente vascular encefálico isquêmico, especialmente aqueles chamados de criptogênico (em que há ausência de etiologia identificável, após avaliação diagnóstica padrão), mesmo na ausência de fibrilação atrial clinicamente aparente. Dado que a anticoagulação tem um papel comprovado na fibrilação atrial e a inter-relação entre a fibrilação atrial e a cardiopatia atrial, a anticoagulação também pode reduzir o risco de acidente vascular encefálico em pacientes com cardiopatia atrial e sem fibrilação atrial clinicamente aparente. Dessa forma, foi realizado o estudo ARCADIA com o objetivo de testar se a anticoagulação é superior à terapia antiplaquetária para prevenção da recorrência de acidente vascular encefálico em pacientes com acidente vascular encefálico criptogênico recente e evidência de cardiopatia atrial.
Ensaio clínico randomizado
Multicêntrico
Duplo cego e Double Dummy
Foi estimado que 1100 pacientes com 150 eventos do desfecho primário forneceriam ao estudo um poder de 80% em um nível alfa bilateral de 0,05
Pacientes com acidente vascular encefálico criptogênico selecionados entre 2018 e 2022
Idade ≥ 45 anos
Diagnóstico clínico de AVC isquêmico + imagem cerebral para excluir AVC hemorrágico
Escala de Rankin modificado ≤ 4
Ser randomizado em no máximo 180 dias após o AVC
Acidente vascular encefálico (AVC) embólico de causa indeterminada, definido como todos os seguintes fatores:
AVC que não seja lacunar, ausência de aterosclerose intracraniana ou extracraniana que cause estenose luminal ≥ 50% da artéria que irriga a área de isquemia, ausência de fonte cardioembólica com grande risco para embolia (fibrilação atrial, trombo intracavitário cardíaco, prótese valvar metálica cardíaca, mixoma atrial, estenose mitral moderada a grave), ausência de outra causa específica identificável para AVC (arterite, dissecção, vasoespasmo, abuso de drogas e estados de hipercoagulabilidade)
História de fibrilação atrial, fibrilação atrial no ECG de 12 derivações ou qualquer fibrilação atrial, de qualquer duração, durante a monitorização do ritmo cardíaco
Indicação de terapia anticoagulante
Fração de ejeção < 30%
Indicação definitiva para uso de terapia antiagregante plaquetária
AVC hemorrágico prévio
Doença renal crônica com creatinina sérica ≥ 2,5mg/dl
Hepatite ativa ou insuficiência hepática com escore Child-Pugh B ou C
Diátese hemorrágica clinicamente significativa
Hb < 9g/dl ou Plaq < 100 x 109 /L
Sangramento gastrointestinal no último ano, considerado clinicamente significativo pelo investigador.
Risco de gravidez
Alergia ou intolerância conhecida à aspirina ou apixabana
Condições que possam prejudicar o seguimento ou participação segura no ensaio clínico, de acordo com o julgamento do investigador.
Apixabana via oral 5mg 2 vezes ao dia
Caso houvesse indicação para redução de dose, de acordo com os critérios padrão – 2,5mg – 2x/dia
Aspirina via oral 81mg ao dia
Devido ao fato do termo “AVC criptogênico” poder ser aplicado a casos com múltiplas etiologias potenciais e casos com uma avaliação diagnóstica incompleta, foi usado o critério de consenso para um AVC isquêmico embólico de causa indeterminada para estabelecer um diagnóstico rigoroso de acidente vascular encefálico criptogênico, que incluía apenas casos sem etiologia aparente após investigação padrão.
Os participantes que preenchiam os critérios de eligibilidade passaram por triagem para diagnóstico de cardiopatia atrial. Esta era definida por pelo menos 1 dos seguintes marcadores: força terminal da onda P na derivação V1 do ECG maior do que 5000mV x ms; NTproBNP sérico maior do que 250pg/ml ou índice de diâmetro atrial esquerdo maior ou igual a 3cm/m² no ecocardiograma. Uma vez que os participantes atingiam os critérios para cardiopatia atrial, eram randomizados para o grupo intervenção ou grupo controle.
Primário: acidente vascular encefálico recorrente de qualquer tipo (isquêmico, hemorrágico ou indeterminado)
Primário de segurança: hemorragia intracraniana sintomática (o que inclui transformação hemorrágica sintomática de um acidente vascular encefálico isquêmico e hemorragias maiores que não sejam intracranianas).
Secundários: composição de acidente vascular encefálico isquêmico recorrente ou embolismo sistêmico e a composição de acidente vascular encefálico recorrente de qualquer tipo ou morte por qualquer causa, mortalidade por todas as causas
MasculinoFeminino
Grupo Apixabana (N=507) x Grupo Aspirina (N=508):
Idade (anos): 67,8 (10,8) x 68,2 (11)
Raça
Asiáticos: 1,4% x 2%
Negros: 21,4% x 21,4%
Brancos: 76% x 75,8%
Peso médio (kg): 85,1(20,1) x 84,5 (20,2)
Hipertensão: 78,1% x 76,4%
Uso de tabaco atual ou prévio: 45,4% x 39,4%
Diabetes: 30,8% x 31,3%
Acidente vascular encefálico (AVC) prévio ou ataque isquêmico transitório: 19,1% x 19,7%
Doença isquêmica cardíaca: 11,4% x 9,1%
Insuficiência cardíaca: 7,1% x 6,9%
Doença arterial periférica: 2,4% x 1,4%
CHADSVASC (médio): 4,7 (1,3) x 4,7 (1,3)
Escala NIH (média): 1 (0-3) x 1(0-3)
Dias desde o AVC até a randomização (médio): 48 (21-96) x 53 (23 – 100)
O estudo foi interrompido precocemente por futilidade
O desfecho primário de eficácia de recorrência de acidente vascular encefálico ocorreu em 40 pacientes no grupo apixabana, com uma taxa anualizada de 4,4% e em 40 pacientes no grupo aspirina, com uma taxa anualizada de 4,4% (HR 1,00 [IC95%, 0,64 – 1,55]; p =0,99)
O desfecho secundário de eficácia de recorrência de AVC isquêmico ou embolia sistêmica foi semelhante entre os grupos e ocorreu em 37 pacientes no grupo apixabana vs. 40 pacientes no grupo aspirina (taxa anualizada de 4,1% e 4,4%, respectivamente (HR 0,92 [IC95%, 0,9 – 1,44])
O desfecho secundário de eficácia de AVC recorrente ou morte foi semelhante entre os grupos e ocorreu em 67 pacientes no grupo apixabana – taxa anualizada, 7,3% e em 62 pacientes no grupo aspirina – taxa anualizada, 6,8% (HR 1,08 [IC95%, 0,76 – 1,52])
Fibrilação atrial foi diagnosticada em 14,7% dos pacientes em uma média de 30 semanas após randomização
Não houve diferença com relação ao desfecho primário de segurança. A hemorragia intracraniana sintomática não ocorreu em nenhum paciente no grupo apixabana e em 7 pacientes no grupo aspirina, sendo uma taxa anualizada 0% e 1,1%, respectivamente
Hemorragias maiores que não fossem intracranianas ocorreram em 5 pacientes no grupo apixabana – taxa anualizada 0,7% e em 5 pacientes no grupo controle – taxa anualizada de 0,8% (HR 1.02 [9IC95%, 0.29 – 3.52])
O desfecho secundário de segurança de mortalidade por todas as causas foi semelhante entre os grupos e ocorreu em 12 pacientes no grupo apixabana – taxa anualizada de 1,8% e em 8 pacientes no grupo aspirina – taxa anualizada de 1,2% (HR 1,53 [IC95% 0,63 – 3,75])
Em pacientes com acidente vascular encefálico criptogênico e evidência de cardiopatia atrial sem fibrilação atrial, apixabana não reduziu significativamente o risco de acidente vascular encefálico recorrente quando comparada à aspirina
Comparou o impacto de duas drogas seguras sobre a recorrência de acidente vascular encefálico isquêmico em pacientes que tiveram AVC criptogênico, o que tem grande relevância para nossa prática clínica.
Utilizou métodos objetivos e validados para exclusão das principais causas de acidente vascular encefálico isquêmico (incluía imagem cerebral, imagem vascular das artérias cervicais, ecocardiograma transtorácico ou transesofágico, um eletrocardiograma (ECG) e a monitorização contínua de ritmo cardíaco por período maior ou igual a 24h para excluir fontes cardioembólicas de alto risco). Dessa forma, reduz confundimento no diagnóstico de AVC criptogênico.
Boa proporção de distribuição de comorbidades entre os grupos de estudo. Menor risco de viés de seleção.
Proporção balanceada de pacientes do sexo masculino e feminino.
Avaliou apenas pacientes com critérios para cardiopatia atrial. Dessa forma, seus resultados não podem ser aplicados em pacientes com AVC criptogênico e sem evidências de cardiopatia atrial.
Monitorização adicional do ritmo cardíaco para detectar fibrilação atrial era permitida a critério dos médicos assistentes e dos investigadores locais, antes e após a randomização. A ausência de critérios padrão para realização de monitorização adicional do ritmo cardíaco pode ter impactado os resultados do estudo.
Baixa proporção de pacientes negros. Ou seja, não houve heterogeneidade étnica
Interrupção precoce do estudo, devido ao alcance dos critérios especificados para futilidade.
Autor do conteúdo
Carolina Ferrari
Referências
Públicação Oficial
https://app.doctodoc.com.br/conteudos/apixabana-para-prevencao-de-recorrencia-apos-acidente-vascular-encefalico-criptogenico-em-pacientes-com-cardiopatia-atrial
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